Andava cansado. Trabalho, trabalho, trabalho... e quem vê alguém sentado lendo não sente que esteja trabalhando pois seu cérebro decodifica “Está tranquilamente sentado num sofá confortável, lendo.”
Sua mulher, esfalfada, reclamava do excesso de trabalho e interrompia seu raciocínio com pedidos irritantes. Os filhos usavam e abusavam de seu carro, afinal papai não tem horários marcados, poderá fazer o que tem que fazer a qualquer hora. A bem da verdade pensavam: papai não tem nada a fazer. Andava muito cansado.
...E a velhice na praia?
Que estava velho era óbvio, ainda naquela semana implantara um dente e sentira também o peso dos anos na viagem, cinco horas de estrada exigiram que fosse para a cama às oito da noite, sem jantar. Estava velho e cansado, muito cansado.
...E os filmes que deixara para ver na velhice?
Não sobrava tempo naquela época e não sobra agora. Assumia compromissos por dinheiro e vaidade. Queria manter-se ativo, intelectual, enquanto participasse de congressos, desse as aulas na pós e aceitasse desafios profissionais continuaria um "nome", uma referência na área.
Não sobrava tempo naquela época e não sobra agora. Assumia compromissos por dinheiro e vaidade. Queria manter-se ativo, intelectual, enquanto participasse de congressos, desse as aulas na pós e aceitasse desafios profissionais continuaria um "nome", uma referência na área.
...Caminhar na areia, ver filmes à tarde, deitar cedo?
Só quando o corpo e a mente exigissem. Não ainda... mas sentia-se exausto.
Encarando a situação, na verdade não era tudo tão árido pois conseguira encontrar um oásis.
Sob as folhas das tamareiras recostava-se a jovem de longos cabelos loiros que o acolhia em seu seio. Uma ilusão, ele sabia, mas ali repousava a cabeça, fechava os olhos cansados de tantas letras, os ouvidos enjoados do palavreado técnico e à brisa ressonava. Seus braços cansados relaxavam na esteira e encontrava vestígios da juventude.
A jovem nunca existira, o oásis era miragem de quem, horas sob o sol, busca a salvação no horizonte. Sentia ainda o cheiro das uvas e dos damascos ao voltar à poltrona confortável com almofadas de faquir e aos tapetes de cacos de vidro, à música das moedas e ao frescor puro do ar condicionado.
Um comentário:
Senti um respingo de desilusao no fim do texto... Seria apenas imaginacao minha?
Postar um comentário