Embora tenha havido desterro
quando do golpe praticado no governo de Floriano Peixoto, em 10 de abril de
1892, foi no início do século passado, no governo republicano de Artur
Bernardes (1902- 1906), que foi abundantemente utilizado, mediante decretação
de estado de sítio, o uso desse
instrumento, com o propósito de
principalmente reprimir e assustar a classe operária que
reivindicava melhorias trabalhistas,
inclusive salariais. Era tratada da mesma forma que os assassinos e ladrões
encarcerados a serem desterrados. O governo aproveitava esse momento para
afastar da cidade do Rio de Janeiro, os descontentes com ele, bem como
elementos da classe pobre e os mendigos.
Paulo
Sérgio Pinheiro no livro “Estratégias da ilusão”, narrando sobre o depoimento
de um antigo ministro da Agricultura, Miguel Calmon Du Pin e Almeida, assinala
que “desde o início da República” essas medidas “deviam ser feitas”,
encaminhando esses desafetos “do Sul para as zonas de fronteira nos e
stados do
Pará e Amazonas, talvez em virtude do princípio constitucional que atribui à
União jurisdição sobre aqueles trechos do território nacional”. Recorrendo aos
informes da imprensa da época, o ministro completa: “Ali amontoados na maior
promiscuidade” (nos navios de
transporte) “crianças e velhos, negros e brancos, nacionais e estrangeiros,
deitados uns, outros de pé, seguros fortemente, de mãos ambas, nos óculos das
espias, procuravam respirar, faziam esforços sobrenaturais para sorver o ar
puro do exterior,que dificilmente penetrava pelos interstícios... Nos porões
nem uma luz! Os 334 condenados, quase nus, debatiam-se nas trevas com as
enormes ratazanas, que silenciosamente os atacavam, cobrindo-os de dentadas.”
Depois que o navio transpôs a barra, “nos porões os presos sem apoio rolavam
uns sobre os outros, magoando-se, escorregando na lama nauseabunda de fezes e
vômitos”.
No
local inóspito do desterro, poucos sobreviviam, sendo a maioria eliminada pelas
doenças contraídas naquele local ou por falta de abrigo ou alimentação.
Pinheiro,
citando trechos colhidos no jornal “Correio da Manhã” de 23 de março de 1905,
comenta: ”A verdade, entretanto, é que não foram arrastados até os calabouços
da ilha das Cobras e de lá retirados para os porões dos navios que os
conduziram aos inóspitos sertões do Amazonas, criminosos e desordeiros, ladrões habituais e outros indivíduos
perigosos e nocivos. Muitos dos desgraçados só tiveram contra si o ódio e a
malquerença de delegados e agentes subalternos da polícia que se aproveitaram
do sítio para ajustar e saciar vinganças; outros foram vítimas da maldade de
delatores, de cujas denúncias a polícia não se deu ao trabalho de averiguar a veracidade”.
Mo mesmo livro comenta que o “governo Bernardes”...
promovia a “limpeza da cidade, como a realizada em 1904 e descrita por Lima
Barreto: A polícia arrebanhava a torto e
a direito pessoas que encontrava pela rua. Recolhia-as às delegacias, depois
juntavam na Polícia Central. Aí, violentamente, humilhantemente,
arrebatava-lhes os cós das calças e as empurrava num grande pátio. Juntadas que
fossem algumas dezenas, remetia-as à ilha das Cobras, onde eram surradas
desapiedadamente.”
Houve desterro também no sertão
Noroeste. Os indesejáveis eram deixados no km. 48 da Estrada de Ferro Noroeste
do Brasil e, sem condições de retornar à cidade, eram eliminados pelos índios
Kaigang.
Eis um resumo do terror
governamental no início do século passado, que quase ninguém conhece e,
lamentavelmente não é ensinado nas escolas, no sentido de nunca mais acontecer.
2 comentários:
Vou ficar craque em história lendo os seus artigos. O Baptista está adorando!!!!!!!
Estou aprendendo muito.
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