domingo, 11 de maio de 2014

Ver além do permitido...

“Ó Tirésias que tudo explora, tanto o sabível quanto o misterioso, o que paira no céu e o que pisa em terra compreendes, embora não enxergues...”


Desde jovem uso óculos. Na família da minha mãe algumas pessoas ficaram cegas na velhice. Isso me amedrontava... Na verdade, as trevas me davam medo. Freud explica!? Claro, inconscientemente eu ficava imaginando como seria não ver. Meus sentidos são desenvolvidos em excesso devido a deficiência visual.  Minha filha comentou que a partir da cirurgia de implante das lentes, eu perderia essa percepção tão apurada de tudo. Credo, eu estou com medo de ver além do permitido, como Tirésias, o conhecido vate da mitologia grega. Por que era cego possuía vaticinium, o poder de predição. Diz uma lenda que Zeus e Hera consultaram Tirésias e este confrontou a deusa. Como castigo ela deu-lhe a cegueira. Zeus presenteou-o com o dom da mantéia/adivinhação e o privilégio de viver sete gerações. Outros dizem que  ele ficou cego ao ter visto Atena se banhando nua. Gosto dessa versão, pois aqui Tirésias viu além do permitido. Mas, voltando à questão de viver mais tempo, sete gerações, a coisa está piorando... Quantas plásticas serão necessárias durante esses anos todos para manter o pescoço lisinho? Esse é meu terceiro casamento. Quantos Baptistas eu preciso ter se viver sete gerações? No mínimo dois. Socorro Rosa Leda. Comece a procurar, pois não resisto a falta dele.  Sou até capaz de viver com a quantidade de ruguinhas e rugonas que passei a enxergar no pescoço, afinal ver é um risco e quanto mais profundo esse ver, maior a quantidade de rugas vistas. Voltando ao assunto não foi Homero ou Platão, mas Sócrates quem me apresentou a Tirésias. O homem era impossível, mesmo cego ele enxergava. Quando famoso foi personagem de tragédias gregas. Em Édipo tem uma presença forte tornando-se o contraponto elucidativo da peça.
“Declaro que vives sem saberes numa comunhão sórdida com teus entes mais caros e não enxergas toda a tua torpeza” disse ao rei em conversa informal. Como Édipo não leu nas entrelinhas demorou um bocado para desvendar o subtexto. O vate estava xingando o rei de cego por não ver sua desdita, apesar de sua integridade física, depois o cego sou eu, deve ter pensado Tirésias, circulando pelo mundo da clareza espiritual. Mas, quando Édipo descobriu a verdade furou os olhos. Seria uma tentativa de tornar-se um vate? Nossa, acho que baixou a pitonisa de algum oráculo grego. Como cheguei aqui? Divagando como sempre. Tudo porque implantei lente multifocal e passei da clareza espiritual para a visual e vi rugas no pescoço. Daí para pensar em plástica para esticar o dito cujo foi um pulo. Vou começar a escolher o modelo. Nefertiti, a mais bela do Egito? Afrodite, a deusa da beleza no Olimpo? Simonetta Vespucio, a modelo de Botticelli? Jeanne Hebuteine, a musa de Modigliani?  A fotógrafa Dora Maar, o grande amor de Picasso?  Os cisnes têm belos pescoços. Sei não... Acho que vou consultar o Baptista. 

2 comentários:

Rosa Leda disse...

Minha querida xará, pelo que sei Baptista ainda está bem fortinho, em todo caso pensarei no "caso". Gostei muito de seu texto - como sempre. Bjs

Camilla disse...

Olha, eu quero conhecer o Batista. De verdade. ao vivo.