segunda-feira, 31 de agosto de 2009

QUEM É LOUCO, AFINAL?



(Continuação do texto de Rubem Alves cuja primeira parte foi publicada em 17/08/2009)



Para se lidar com o software há que se fazer uso dos símbolos. Por isso, quem trata das perturbações do software humano nunca se vale de recursos físicos para tal. Suas ferramentas são palavras, e eles podem ser poetas, humoristas, palhaços, escritores, gurus, amigos e até mesmo psicanalistas. Acontece, entretanto, que esse computador que é o corpo humano tem uma peculiaridade que o diferencia dos outros: o seu hardware, o corpo, é sensível às coisas que seu software produz.


Pois não é isso que acontece conosco? Ouvimos uma música e choramos. Lemos os poemas eróticos de Drummond e o corpo fica excitado. Imagine um aparelho de som. Imagine que o toca-discos e os acessórios (o hardware) tenham a capacidade de ouvir a música que ele toca e se comover. Imagine mais, que a beleza é tão grande que o hardware não a comporta e se arrebenta de emoção! Pois foi isso que aconteceu com aquelas pessoas que citei no princípio: a música que saía de seu software era tão bonita que seu hardware não suportou.


Dados esses pressupostos teóricos, estamos agora em condições de oferecer uma receita que garantirá, àqueles que a seguirem à risca, saúde mental até o fim dos seus dias. Opte por um software modesto.

- Evite as coisas belas e comoventes. A beleza é perigosa para o hardware.

- Cuidado com a música. Brahms e Mahler são especialmente contra-indicados. Já o rock pode ser tomado à vontade.

- Quanto às leituras, evite aquelas que fazem pensar. Há uma vasta literatura especializada em impedir o pensamento. Se há livros do doutor Lair Ribeiro, por que se arriscar a ler Saramago?

- Os jornais têm o mesmo efeito. Devem ser lidos diariamente. Como eles publicam diariamente sempre a mesma coisa com nomes e caras diferentes, fica garantido que o nosso software pensará sempre coisas iguais.

- E, aos domingos, não se esqueça do Silvio Santos e do Gugu Liberato.


Seguindo essa receita você terá uma vida tranqüila, embora banal. Mas como você cultivou a insensibilidade, você não perceberá o quão banal ela é. E, em vez de ter o fim que tiveram as pessoas que mencionei, você se aposentará para, só então, realizar os seus sonhos. Infelizmente, entretanto, quando chegar tal momento, você já terá se esquecido de como eles eram."

domingo, 30 de agosto de 2009

Futilidades

Estou num momento fútil mesmo. Misto de sem humor com muitas horas na academia então este é sim um post fútil. Só não vou falar de Os Normais 2 porque não vi e, na boa, não vou ver.
Watchmen, graphic novel escrita por Alan Moore e ilustrada por Dave Gibbons, nunca esteve entre meus favoritos. Elektra sim. Odeiei a versão cinematográfica. Vergonha alheia pela personagem. O que era a Jennifer Garner naquela roupinha? E por que, meu D'us?
Talvez por isso tenha amado o filme Watchmen. Porque não tenho apego nenhum as personagens. Adorei. Amei. Vi duas vezes e assim que sair em DVD (já sei até que vai sair uma versão dupla com duas edições diferentes) quero ver de novo. O filme é sombrio na medida certa e mostra como seria o mundo se realmente houvessem super heróis e o que seria deles nas nossas mãosinhas malignas mais cruéis que a de super vilões...

O trailer fala por si só e a música com a letra superhumorhomembombaemdiadechuva é boa e do Muse.

E quem achava que Jesus Luz (eita nominho) estava se achando demais pode se jogar da ponte porque agora o moço vai se achar podendo já que ele faz parte do elenco de estrelas do vídeo comemorativo Celebration de Madonna. Esta lá, no site da megamilionária para quem quiser ver. Sem camisa, se achando e pilotando pick ups no melhor estilo DJ latin lover. Como se isso tudo fosse surpresa para alguém! Ah, há quem diga que Lourdes também estrela o vídeo mas por enquanto eu não vi. E eu só acredito vendo.



A Katylene, a colunista mais high profile da net ainda não comentou o clipe com o Jesus Luz mas publicou quilos de fotos da equipe da novela nova e não é que a Bárbara Paz finalmente vai fazer uma novela na Globo. Nada como casar com o Hector Babenco, mas não sou eu quem está falando isso, é a Katylene, claro!


"Fotografaram bem na hora que o diretor falou “UMA SALVA DE PALMAS PRA BÁRBARA PAZ QUE FINALMENTCHY CONSEGUIU UM PAPEL DE RELEVÂNCIA NA TV BRASILAYRA.”

E nessa semana Noel Gallagher anunciou sua saída do Oasis. Demorou, né? E gostem ou não, Kurt Cobain ressuscitou bem como avatar no Guitar Hero 5. A negociação feita com Dave Grohl (por que? por que?) e a eterna viúva Courtney Love pedia que ele parecesse atlético! O avatar está bem apessoado e parece ter mais humor que o original, principalmente ao tocar Smells like teen spirit, mas daí a ser atlético... Em tempo, se a alma de Kurt Cobain não havia chegado ao purgatório agora chegou e você pode brincar com ela! Dadas as dívidas de Love, demorou, né?



sábado, 29 de agosto de 2009

Ele imaginou os tempos de Al-Andalus...


Eu não sou a única que pensa nesse acaso imprevisto sem paralelos, o argentino Jorge Luís Borges, autor de Aleph, também pensou... Leiam isso: “Escrevia com lenta segurança, da direita para a esquerda, mesmo aplicado em formar os silogismos e encadear os longos parágrafos, Ibn Rushd não deixava de sentir, sob a forma de bem-estar, a casa fresca e profunda que o cercava.” O filósofo, jurista e médico Ibn Rushd, ou Averróis, foi o principal comentarista árabe de Aristóteles, viveu e trabalhou em Córdoba. O parágrafo acima é de autoria de Borges e encontra-se A busca de Averróis. Sua produção literária é transpassada por uma circulação subterrânea de temas e figuras da cultura árabe-islâmica. Na opinião dele desenvolveu-se ali uma extraordinária aventura multicultural. Um momento de “grande abertura intelectual e respeito pela liberdade de opinião alheia.” A arte da conversação e intercâmbio são os traços dessa elite evocada por ele em sua obra. Mas, o al-Andalus de Borges não é o da história, nem o do realismo literário cujo objetivo seria a reconstituição de uma vida, uma biografia. O que está em jogo nessa ficção em primeiro lugar é a busca a que se dedica Ibn Rushd e depois, a tentativa de Borges de restaurar o filósofo em sua verdade mais profunda.
Considerando-se a época em que os fatos aconteceram, a pergunta que não cala é: será al-Andalus a terra idílica descrita por Borges? Não, pois aconteceram momentos de tensão, de perseguição, de censura. O próprio Averróis assistiu ao auto de fé de obras que tomaram parte de seu tempo, fruto de pesquisa e esforço imensos. É claro que existiam amigos fiéis, mas também o ódio tenaz dos medíocres.
No livro de Borges, Averróis tenta compreender o sentido de dois termos lidos em Aristóteles: tragédia e comédia. Como as palavras supunham o teatro, arte desconhecida na civilização árabe da época, ele como um prisioneiro de sua cultura, não poderia imaginar o significado delas, sem ter primeiro uma idéia da própria representação teatral. Talvez, Borges estivesse meditando e questionando se é possível conhecer a cultura alheia. Pois é... Toda reconstituição é alteração. Então, o significado do livro e dessa busca de Averróis é uma lição de Ética na medida em que procura o sentido da alteridade, da diferença, entender o outro, seja quem for esse outro. A ficção de Borges é uma das mais belas homenagens ao momento maravilhoso que foi al-Andalus.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

A liberdade religiosa do século XXI

Gostaria de dividir com os eventuais leitores uma impressão que aos poucos vem batendo à porta de minha nem sempre atenta consciência. É interessante e, a meu ver, digno de nota, o aumento do espaço na mídia ‘lado B’ oferecido à discussão incentivada pelo movimento ateísta, tanto no mundo desenvolvido (definição capenga, mas...), quanto aqui, no dito “em desenvolvimento” (expressão que me lembra a definição de “puberdade”). Tais temas sempre foram postos meio de escanteio pelos redatores e diretores dos meios de comunicação e, agora, começam a ganhar alguma audiência, não sei se mais pela oferta ou por pressão da demanda. O que posso apresentar, em dados objetivos é que: 1) a mais recente edição da revista Superinteressante trouxe uma matéria sobre um acampamento destinado exclusivamente a ateus de até 17 anos (não que esta seja uma idade onde se pode dizer que se acredita, ou não, em algo...); 2) a edição de agosto da já respeitada revista Piauí também trouxe uma pequena nota sobre o incremento da organização do movimento humanista secular (eufemismo para ateísmo) no Brasil, além de ressaltar os laços entre esta e outras organizações ateístas ao redor do mundo e, principalmente, na Inglaterra; 3) o canal pago de notícias GloboNews está exibindo uma série de programas gravados na Feira Literária Internacional de Paraty – FLIP – durante palestra de Richard Dawkins, biólogo queniano-britânico, autor de Best seller’s como “Deus: um delírio” e “O gene egoísta” e que é considerado referência (para não dizer um ‘messias’) entre os totalmente não-crentes; 4) o (outro) canal pago GNT exibe nos dias 24 e 31 de agosto um documentário em duas partes produzido pelo mesmo Richard Dawkins, no qual se traça um panorama dos argumentos do ateus em prol da contínua e crescente laicização das sociedades humanas.

Desde o ano de 2005 estudo o problema da Liberdade Religiosa e suas relações com as ciências sociais aplicadas e, dentre elas, mais especificamente o direito (foi este o meu trabalho de iniciação científica na área jurídica). Dos frutos desse trabalho posso oferecer aos leitores algumas conclusões no mínimo curiosas (todas amplamente abertas à discussão). Em primeiro lugar é uma ilusão acreditar que as sociedades ocidentais não sejam fortemente sustentadas por argumentos (de base) religiosos. Um exemplo nítido disso é a dificuldade que alguns membros do Ministério Público estão tendo para remover das salas de audiências de fóruns e tribunais os símbolos ostensivos da religião católica, como crucifixos. O argumento dos promotores é que, sendo o Brasil uma nação laica (sem religião oficialmente declarada), a presença de símbolos de uma determinada confissão religiosa pretere os fiéis das demais religiões, bem como os sem confissão alguma.

Outra questão interessante é a velada guerra religiosa que algumas confissões neo-pentecostais movem contra as confissões religiosas de matriz africana, como o candomblé e a umbanda. Rituais de “expulsão de demônios” têm sido considerados como ofensivos por vincular religiões afro à “maldade” e “energias negativas”, características veementemente negadas pelos adeptos destas. Até mesmo ataques violentos contra “pais-de-santo” já foram noticiados à polícia em comunidades do subúrbio carioca, áreas em que a presença do Estado, como sabido, é mínima (quando não totalmente inexistente).

Inegável ainda a pressão que muitos ateus sofrem ao manifestar sua descrença, num fenômeno pós-moderno, mas que repete, na essência, as perseguições religiosas da idade média. Algumas pesquisas sugerem que a rejeição a ateus é percentualmente muito maior (e bem menos noticiada pela mídia) do que a sofrida por homossexuais e transexuais, havendo relatos de perseguição no ambiente de trabalho e rompantes de violência psíquica e física. Em virtude destas opressões, parcela do movimento ateísta britânico lançou uma campanha nos moldes do “saia do armário”, buscando incentivar ateus ‘retraídos’ a manifestarem sua descrença em qualquer entidade(s) ou consciência(s) superiores.

Não obstante tais informações, e independentemente das convicções religiosas de cada um, é preciso que se considere que a crença em qualquer ou quaisquer forma(s) de deus(es) não é condição necessária da dignidade dos homens e mulheres. O debate, como sabido, é muito difícil, pois acaba muito próximo das discussões sobre arte, nas quais a subjetividade do observador fala mais alto do que nossa capacidade de expressão. Todavia, a liberdade de manifestação respeitosa é elemento da civilização em seu estágio atual. E deve ser mantida a todo custo, sendo digna de aplauso a iniciativa dos meios de comunicação anteriormente citados. Afinal, a perseguição religiosa contra não-crentes se mostra um dos maiores absurdos da humanidade deste inicio de século XXI.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Para rir...

Fui ao stand up do Rafinha Bastos, meu CQC favorito e me diverti bastante.



segunda-feira, 24 de agosto de 2009

QUEM É LOUCO, AFINAL?

Texto de Rubem Alves

Fui convidado a fazer uma preleção sobre saúde mental. Os que me convidaram supuseram que eu, na qualidade de psicanalista, deveria ser um especialista no assunto. E eu também pensei. Tanto que aceitei. Mas foi só parar para pensar para me arrepender. Percebi que nada sabia. Eu me explico.
Comecei o meu pensamento fazendo uma lista das pessoas que, dentro do meu ponto de vista, tiveram uma vida mental rica e excitante, pessoas cujos livros e obras são alimento para a minha alma. Nietzsche, Fernando Pessoa, Van Gogh, Wittgenstein, Cecília Meireles, Maiakovski. E logo me assustei.
Nietzsche ficou louco. Fernando Pessoa era dado à bebida. Van Gogh matou-se. Wittgenstein alegrou-se ao saber que iria morrer em breve: não suportava mais viver com tanta angústia. Cecília Meireles sofria de depressão crônica. Maiakovski suicidou-se. Essas eram pessoas lúcidas e profundas que continuarão a ser pão para os vivos muito depois de nós termos sido completamente esquecidos. Mas será que tinham saúde mental? Saúde mental, essa condição em que as idéias comportam-se bem, previsíveis, sempre iguais, sem surpresas, obedientes ao comando do dever, todas as coisas nos seus lugares, como soldados em ordem unida, jamais permitindo que o corpo falte ao trabalho, ou que faça algo inesperado; nem é preciso dar uma volta ao mundo num barco a vela, bastar fazer o que fez a Shirley Valentine (se ainda não viu, veja o filme) ou ter um amor proibido ou, mais perigoso que tudo isso, a coragem de pensar o que nunca pensou.
Pensar é uma coisa muito perigosa... Não, saúde mental elas não tinham. Eram lúcidas demais para isso. Elas sabiam que o mundo é controlado pelos loucos e idosos de gravata. Sendo donos do poder, os loucos passam a ser os protótipos da saúde mental.
Claro que nenhum dos nomes que citei sobreviveria aos testes psicológicos a que teria de se submeter se fosse pedir emprego numa empresa. Por outro lado, nunca ouvi falar de político que tivesse estresse ou depressão. Andam sempre fortes em passarelas pelas ruas da cidade, distribuindo sorrisos e certezas.
Sinto que meus pensamentos podem parecer pensamentos de louco e por isso apresso-me aos devidos esclarecimentos. Nós somos muito parecidos com computadores. O funcionamento dos computadores, como todos sabem, requer a interação de duas partes. Uma delas chama-se hardware, literalmente "equipamento duro", e a outra se denomina software, "equipamento macio". O hardware é constituído por todas as coisas sólidas com que o aparelho é feito. O software é constituído por entidades "espirituais" - símbolos que formam os programas e são gravados nos disquetes.
Nós também temos um hardware e um software. O hardware são os nervos do cérebro, os neurônios, tudo aquilo que compõe o sistema nervoso. O software é constituído por uma série de programas que ficam gravados na memória.
Do mesmo jeito, como nos computadores, o que fica na memória são símbolos, entidades levíssimas, dir-se-ia mesmo "espirituais", e o programa mais importante é a linguagem. Um computador pode enlouquecer por defeitos no hardware ou por defeitos no software. Nós também. Quando o nosso hardware fica louco faz-se necessário chamar psiquiatras e neurologistas, que virão com suas poções químicas e bisturis consertar o que se estragou. Quando o problema está no software, entretanto, poções e bisturis não funcionam. Não se conserta um programa com chave de fenda. Porque o software é feito de símbolos, somente símbolos podem entrar dentro dele. (continua na próxima semana)