sábado, 13 de agosto de 2011

O belo é difícil, dizia Platão...

Quando a Janaina sugeriu que uma das Rosas falasse sobre arquitetura, comecei quase que imediatamente puxar pela memória em busca de informações e paralelos contemporâneos para justificar as construções mexicanas tão coloridas. Lembrei-me, também, das revistas de arquitetura e artes decorativas publicadas durante a década de 1930, presente do senhor Gabriel Pelegrina. Isso para historiadores é um achado e tanto. Em uma delas tem até um guia com dispositivos do Código Civil sobre propriedade e construção. As reproduções vão desde casas simples até residências enormes com áreas para serviço e “lugar para engommar”. Imagine só, um local para passar e engomar roupas! Ah, velhos e bons tempos aqueles. O fato fez-me lembrar de um texto de título Soft city, de Jonathan Raban escrito nos anos 1970 pressagiando as mudanças na vida das cidades. Ele também deveria ter pensado em um código de estilo para residências e de boas maneiras para vizinhos, isso para falar só na invasão de privacidade de algumas torres, do barulho, do circular com cachorros sem os cuidados necessários, etc, etc. Mas, deixa para lá...
Nesse texto, Raban usou pela primeira vez o termo yuppie. Ele referia-se aos jovens profissionais urbanos, tão conhecidos hoje em dia. Dentro suas ideias, uma delas, na contra mão da história, dizia que as cidades não estavam sendo devoradas pelos planejadores, como diziam alguns entendidos, pois elas são extremamente complexas. Ao mesmo tempo, ele comparava-as aos labirintos, enciclopédias, empórios e teatros. Uma povoação, afirmava o citado autor, convida o habitante a refazê-la amoldando-se sem resistência quando existe tentativa de impor-lhe uma nova forma. Acreditava que toda cidade é plástica – ele usa o termo com sentido de maleável – por natureza e o seu morador não é alguém dedicado à racionalidade matemática como supõem os sociólogos. Daí ela ser como um labirinto, formada por colméias, por redes tão diversas de interação social e orientada por diferentes metas transformando-se em “um livro de rabiscos de um maníaco, cheio de itens coloridos sem nenhuma relação entre si, nenhum esquema determinante racional ou econômico.” A idéia é interessante. Enciclopédia é uma obra de referência em todos os campos do conhecimento tratando de forma alargada um assunto específico. Empório, no mundo antigo, era uma colônia comercial internacional e hoje é um estabelecimento onde são vendidos vários tipos de mercadoria. A analogia é clara. Pensem em um local como Bauru e sua diversidade enorme de preferências. Dá para perceber que a homogeneidade de valores está em dissolução. Meu propósito não é criticar, pois o velho provérbio popular diz: gosto não se discute, e não se discute mesmo.
Essas diferenças existiram sempre e as reproduções das revistas confirmam a idéia de uma localidade ser demasiado complexa para ser disciplinada. Arte e estilo são as palavras para descrever a relação peculiar entre o homem e o material construtivo existente na contínua interação criativa da vida urbana. A Brasília ideal imaginada por Lucio Costa e Oscar Niemeyer não existe. Ela tornou-se real demais, próxima de um pesadelo, embora diga em seu favor que outras localidades não planejadas, também, perderam o rumo. Toda cidade pode ser um teatro, embora isso queira dizer a presença de vilões e tolos, com os quais nem sempre se quer conviver. Sem falar na mistura de tendências e modas reduzindo empreendimentos a fantasias e disfarces como cenários de peças fantásticas. Jonathan Raban estava certo. Um local pode ser uma enciclopédia, um labirinto e um teatro, tudo ao mesmo tempo. Então, como a característica da pós-modernidade é a citação, não está na hora de contrariando Platão, começar a reeditar revistas antigas e de boa qualidade em busca de um empório de estilos simples e bonitos de se ver?

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