sábado, 22 de outubro de 2011

Museu, o filho de Orfeu

No século VI a.C. Dioniso teve permissão para entrar no refinado mundo helênico, pois a Grécia retomou certos cultos aos deuses estrangeiros. A misteriosa religião representava a reintegração do irracional na concepção do divino, e recebeu em terras gregas o nome de orfismo. O termo derivado de Orfeu, o poeta do sorriso nos lábios e da lira nas mãos, passava longe do sofrimento até conhecer Eurídice. Ele tentou resgatá-la do inferno, mas vencido pela curiosidade olhou para trás transformando a amada em “escultura”.
Orfeu teve um filho: Museu. Ele legou ao mundo uma vasta produção artística, além de ter compilado a obra do pai. Museu, como Orfeu, tinha o poder de ver a poética dos objetos e despertar o sentimento do belo nas pessoas. O museu, como local, possui a função de templo das artes, depósito de bens culturais, com o mesmo sentido da palavra museulium, o ato do filho, de recolher e juntar fragmentos das composições do pai. O Museu como lugar revela uma função crítica ao reconhecer a importância do material selecionado e repassar através de exposições a informação contida nesses documentos testemunhais, enquanto sua ação é poética, buscando o significado e a valorização da produção artística colecionada. O templo habitado pelas musas tinha o nome de mouseion. Recebia oferendas e diferentes materiais exibidos ao público mediante o pagamento de uma pequena taxa! Seria o embrião do museu atual?

Desde épocas remotas existiam conjuntos de obras espalhadas pelo mundo. Um colecionador famoso como Nabucodonosor apreciava antiguidades, mania imitada por sacerdotes da Mesopotâmia. O Egito não ficava atrás reunindo objetos, aos quais se juntaram obras escritas, formando a Biblioteca de Alexandria. Colecionar fazia parte da história da cultura humana e na Renascença o acervo Medici, em Florença, era invejável evidenciando que a história da arte não é evolução do simples para o complexo ou do primitivo para o sofisticado, mas a história de formas criativas produzidas pela imaginação humana na pintura, tapeçaria, arquitetura, escultura, etc.
No século XVII, algumas instituições e suas coleções tomaram o aspecto que possuem hoje repetindo a postura crítica do Museu poeta. O trabalho profissional de reunir, selecionar e guardar peças para mostrar em um espaço chamado museu revela-se subjetivo e cheio de significados. A produção cultural quando exposta acaba recebendo, através do olhar do espectador moderno, outro valor e nova significação. Daí a importância do Museu como irradiador de cultura com suas ações práticas e exposições didáticas e/ou educacionais dirigidas a um público cada vez mais ávido de informação.

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