quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

O Pensamento de Leonardo Boff

IHU -Quais as principais ameaças que pesam sobre nosso futuro?

Leonardo Boff - São dois blocos de ameaças. Um vem pela máquina de
morte, que é nossa cultura militarista, que criou um tal número de
armas nucleares, químicas e biológicas que pode destruir muitas vezes
toda a vida do planeta. São armas muito deletérias, que estão em
segurança, mas nunca segurança em absoluto. Vimos isso em Chernobyl e
Fukushima. Além disso, temos as nanotecnologias. A guerra cibernética
pode ser de alta destruição. Trata-se de uma guerra não declarada, de
extrema violência e que pune os inocentes. O segundo bloco de ameaças
é aquilo que nosso processo industrialista fez nos últimos 300, 400
anos, com a sistemática agressão à Terra, aos seus bens, seus
recursos. Chegamos a um ponto em que desestabilizamos totalmente o
sistema Terra, e a manifestação disso é o aquecimento global. Para
repor o que tiramos da Terra em um ano, ela precisa de um ano e meio.
Então, a Terra já está exterminada. Estamos alcançando uma temperatura perto de + 2º C e a comunidade científica
norte-americana alertou para o fato de que, com a entrada do metano,
do degelo das camadas polares e outros fatores, a Terra vai se
aquecendo devagar e, de repente, a febre de 37º C pula para 45º C. Com
esse aquecimento abrupto, a vida que conhecemos hoje não vai
subsistir, nem animal, nem vegetal, nem humana. Como temos tecnologia,
podemos criar pequenos oásis refrigerados para grupos de seres humanos
que, seguramente, vão invejar quem morreu antes, tão miserável será a
vida. Isso pesa sobre a humanidade nos próximos decênios e ninguém
acredita nisso, porque vai contra o sistema da acumulação, contra o
capitalismo, contra as grandes empresas. Os intelectuais que têm algum
sentido ético precisam falar sobre isso.

IHU On-Line - Em que situações de nossa sociedade mais se pode ver o
Cristo Crucificado?

Leonardo Boff - Há um velho dito da tradição cristã que diz: onde está
o pobre, aí está Cristo. Hoje temos que olhar em cada cidade do
terceiro mundo, os grandes cinturões de miséria, as favelas. O cristão
que toma a sério a percepção de que Cristo está onde o pobre está tem
que visitá-lo. Não basta identificar que lá tem uma favela. É preciso
ir até lá, conversar com as pessoas, ver como é possível ajudá-las a
se organizar melhor. Há outro dito que diz: onde estão os pobres está
Cristo, e onde está Cristo está a Igreja. Só que não é verdade que
onde está o pobre está a Igreja. Ela está mais perto do palácio de
Herodes do que da gruta de Belém. A Igreja precisa ver qual é o seu
lugar na sociedade.

IHU On-Line - Em que sentido o capitalismo pode ser apontado como anticristão?

Leonardo Boff - Em primeiro lugar, o capitalismo é antivida. Ele
assassina as vidas humanas para acumular. Para que alguns tenham
qualidade de vida, muitos devem ter péssima qualidade de vida. E isso
é injusto. E tudo o que vai contra a vida acaba sendo contra aquele
que disse: "Eu vim trazer vida e vida em abundância". Por isso é
anticristão. E isso custou muito aos cristãos reconhecerem, porque as
igrejas se instalaram muito bem dentro do sistema capitalista. A
Igreja teve dificuldade de condenar, pois o capitalismo não nega a
Igreja, nem a religião. Pelo contrário, defende a Igreja e a moral. Só
que, na prática, nega tudo isso. E essa é a grande ilusão da Igreja,
pois o capitalismo passa por cima de todo mundo, sem solidariedade.
Nele, só o forte ganha.

IHU On-Line - Baseado em que o senhor afirma que os Estados Unidos é o
grande terrorista mundial?

Leonardo Boff - Na prática ele é o grande terrorista porque, na
América Latina, apoiou todas as ditaduras e participou ativamente de
atentados, sequestros de pessoas, fornecendo informações. E continua
com essa estratégia, que é a estratégia do império. Onde há uma
oposição, ele vai e destrói. Só me admiro que não conseguiu eliminar
 Hugo Chávez, na Venezuela, nem Fidel Castro, mesmo tentando por
17 vezes, sem resultado. Os Estados Unidos sempre usam a violência
militar para se impor. E faz isso em todas as partes, como fez na
Líbia, por exemplo, com os aviões não pilotados. Acredito que assim
que passar as eleições fará uma intervenção na Síria com aviões não
pilotados também.

IHU On-Line - Independentemente se Obama fica ou não?

Leonardo Boff - Independentemente. Até o próprio Obama. Porque eles
não vão segurar Israel e também não vão liquidar com o Irã. Então, a
arma não é a diplomacia e a busca de caminhos de paz, mas a arma da
submissão. E eles são fortes, hoje, não na economia - pois a China é
mais -, nem na tecnologia - o Japão e outros países são mais -; eles
só têm o domínio militar do mundo, com a possibilidade de matar a
todos. Em nome disso, submetem todo o mundo. Não há ninguém que se
oponha ao império, a não ser Venezuela, Cuba e Coreia do Norte. Todos
os demais, inclusive o Brasil, fazem inclinação aos Estados Unidos. É
um império cujo imperador é afro-americano, mas com a mesma
perversidade de Bush e outros, porque o projeto não mudou.

IHU On-Line - O senhor disse que reconhecer a Igreja de Roma como a
única verdadeira é um erro teológico. Por quê?

Leonardo Boff - É um erro teológico porque supõe o conceito
reducionista de Deus, como se Ele dissesse: "Esses são meus filhos e
aqueles não são; essas são minhas criaturas queridas e aquelas são
filhos abandonados". Isso não existe para Deus. Todos nasceram do seu
coração. Deus acredita em todos os seres humanos. Todos são filhos e
filhas, não só os batizados, que por acaso nasceram no Ocidente.
Então, uma Igreja que faz isso se opõe a Deus.


2 comentários:

janirabastos@gmail.com.br disse...

Uau... O homem atirou para todos os lados. Pior é que ele tem razão, não é Rosa Leda?

rosabertoldi@gmail.com disse...

Mais uma seguidora do Padre Beto? Sou fã do moço. Coragem ele tem. Boff tbem foi corajoso em suas afirmações.