segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Juridicamente Impossível (IV)


Poucos minutos depois a encarregada do velório se aproxima apresentando a Júnior o rapaz do Crematório.
- Crematório? Flávio será enterrado, não é preciso haver vontade expressa para cremar?
- Ah, senhor, é uma promoção que estamos fazendo quando o falecido não tem parentes. Como o senhor deve ter lido no jornal – saiu no Bom Dia de ontem – em Redditch, na Inglaterra, foi iniciada uma experiência e como o dono de nosso crematório fez faculdade lá e está em contato com amigos, foi convidado a desenvolver a experiência aqui no Brasil. Olhe o recorte. Entregou-lhe a página de jornal dobradinha. Enquanto lia, ouvia o rapaz que continuava explicando: o crematório fizera um acordo com um clube das proximidades que aproveitaria o calor dos fornos para aquecer a piscina. Para tanto precisavam ter sempre corpos sendo cremados. Júnior sentiu uma repulsa enorme pela situação e decidiu, naquele momento, que não nadaria mais em águas aquecidas.
- O senhor assina a autorização, por favor?
Quase disse que perguntaria ao morto mas parou a tempo e informou que pensaria por alguns instantes, que aguardasse ali. Aproximou-se de Flávio e contou o que estava acontecendo. O “morto” quase pulou e saiu correndo. Júnior chorava de rir e alguns amigos aproximaram-se para consolá-lo. Ao levantar os olhos viu o rapaz do crematório conversando com o cadeirante que, informaram-lhe depois, era o dono do Crematório sendo a moça bonita, cujo nome era Jovenlinda, sua relações-públicas. Esses eram verdadeiramente caça-defuntos.
Júnior sentia que a situação se complicava. Flávio transpirava, as flores estavam murchando, por quanto tempo ainda conseguiria segurar a situação?
Sem dúvida o ambiente estava animado. Mais de cem pessoas se esparramavam pela sala e corredor.
- Decide, cara, se já está feliz, se já aproveitou e ouviu alguns lamentos, já curtiu tudo o que queria, revele-se e enfrente a situação, tô ficando de saco cheio.
- O duro é a dor nas minhas costas e minhas mãos formigando. Estão roxas o suficiente? O aspecto geral está bom?
- Ô, seu desgraçado, ainda está curtindo? Vou assinar o papel do crematório.

domingo, 30 de janeiro de 2011

E a correria pela Virada está a pleno vapor e a semana não foi das mais inspirativas, então fiz como a Rosa Bertoldi e estou publicando um texto do Edson Aran, porque aparentemente todo mundo perde a boa, menos o Aran.


21 OCUPAÇÕES PARA UM EX-PRESIDENTE

Tente, invente, faça um amanhã diferente

1 – Móbile. É só amarrar o cara no teto.

2 – Domador de egos. Ele não consegue domar o próprio, mas doma muito bem o da nova presidente.

3 – Comentarista esportivo na Globo. Aí todo mundo poderá dizer “Não cala a boca, Galvão!”

4 – Espantalho. É só deixar o cara de braços abertos no meio da convenção do PMDB para espantar os corvos. Vai que funciona...

5 – Peso de papel.

6 – Ator em minissérie bíblica da Record. Alguém sempre terá de fazer o papel de Caifás, não?

7 – Personagem do “Zorra Total”. Digo, tornar oficial o personagem do “Zorra Total” que ele sempre foi.

8 – Jurado do Prêmio Jabuti.

9 – Dançarina do programa do Faustão.

10 – Degustador de cachaça em alambiques de Salinas.

11 – Degustador de cachaça em alambiques de Parati.

12 – Degustador de cachaça em qualquer lugar.

13 – Garoto propaganda de xampu para branquear cabelos.

14 – Lutador de luta-livre (El Caudilho Enmascarado!)

15 – Comentarista do Manhattan Connection.

16 – Apresentador de noticiário policial às seis da tarde.

17 – Animador de auditório (“Quem quer dinheiruuuummmm?”)

18 – Colunista da Carta Capital

19 – Jurado do Jabuti

20 – Porteiro de boate.

21 -- Pêndulo. É só pendurar a criatura pelo. Pé, evidentemente. Ex-presidente merece respeito, ô leitor degenerado.

sábado, 29 de janeiro de 2011

A cabala da inveja

Meu autor predileto é Nilton Bonder. Rabino equilibrado com muitos livros traduzidos para diferentes línguas, ele é modesto, jovem e surfista, dentre outras coisas. Lembro-me dele há anos atrás - na Hebraica - lendo em hebraico o Eclesiastes transcrito por Haroldo de Campos, que por sua vez lia em português. Uma noite e tanto compartilhada com meus filhos.
Teria isso influenciado ambos em suas carreiras? Eles trabalham direta ou indiretamente com cultura. Mas, vamos ao assunto. Aconteceram duas coisas. Primeiro ganhei de um amigo A Cabala da Inveja. Ele faz parte de uma trilogia composta pelos A Cabala da comida e A Cabala do dinheiro. O mote do rabino é a possibilidade de se modificar uma atitude a partir do pressuposto da existência de outro ser humano em nós e um nós no outro! São conselhos trazidos diretamente da Torá e Talmud vindas de um homem ponderado compartilhando a força poética da palavra bíblica com o leitor comum da mesma maneira que com o intelectual, um dos irmãos Campos há tempos atrás. "eu vejo surgir teus poetas de campos e espaços..." Esse mesmo, homenageado por Caetano em Sampa, quem não se lembra?
Segundo: estou sem nenhum ajudante para trabalhos domésticos desde outubro por falta de tempo de procurar ou por falta de vontade. Existirá uma cabala da preguiça? Quem aparece por aqui é o jardineiro, ainda bem, senão seria a segunda floresta amazônica, bem no centro do estado de Sampa... Descobri por acaso: um dos funcionários do condomínio onde vivo disse que em suas folgas limpava telhados, vidros, lavava carros, etc, etc. Pronto encontrei a solução para uma parte do problema. Ele esteve aqui na sexta e no sábado e vai voltar. A casa está começando a brilhar de novo. Mas, em conversa comentou comigo que sua mulher perguntou como havia sido o seu dia de trabalho e como eu era. Ele respondeu: ela tem um brilho diferente. Pensei: minha pele deve estar bem oleosa, mesmo. Efeito do Emedeen para mulheres acima dos cinquenta? Sei lá. Por via das dúvidas quando tomei banho usei um shampoo para cabelos oleosos e aproveitei para lavar o rosto com ele. Olhei no espelho e não brilhava... No dia seguinte o moço contou para mim e meu marido sobre uma fábula ouvida do pastor na noite anterior na igreja. O moço é evangélico. Prestem atenção, pois é bem interessante. Uma cobra estava andando pela floresta com fome. Ao encontrar um vagalume tentou comê-lo. O pirilampo pediu um tempo para perguntar à cobra o seguinte: pertenço a sua cadeia alimentar? Vou satisfazer sua fome? Não. Então, por que você vai me devorar? E a cobra respondeu: Não tolero o seu brilho. Pensei: então esse era o brilho!!! Serei realmente alguém com um brilho próprio como dizem meus amigos? Conversa e elogio de amigo não está valendo, porém a conclusão é: quando a gente brinca sobre a questão de um elefante incomodar muita gente, acho que o certo seria dizer: um pirilampo incomoda muito mais. Basta olhar ao redor. Quanta cobra venenosa a gente vê querendo acabar com pessoas que na opinião dela está fazendo sombra ou incomodando. Oh, rabino, reze por todos os vagalumes humanos desse nosso mundo tão invejoso!

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Por email

Fala ae galerinha, tudo bom?


Espero que sim...



com o anúncio dos indicados ao Oscar, ontem, um dos meus assuntos preferidos é justamente a premiação da indústria norte-americana. Qual será o melhor filme? Você acha que a atuação daquela atriz realmente merece ser agraciada com a estatueta do Oscar? Será que aquele documentário vai estrear no Brasil? Enfim, o assunto é cinema.



e, falando nisso, o fim de semana reserva a estreia de "Inverno da Alma", que tem no elenco a novata Jennifer Lawrence. O filme, um dos destaques do prestigiado festival de Sundance, abre a temporada de produções indicadas ao Oscar: na semana que vem, por exemplo, chegam às telas de cinema o aguardadíssimo "Cisne Negro" e "O Vencedor", que tem atuações sublimes de Christian Bale, Melissa Leo e Amy Adams (a minha mais nova jovem atriz preferida... risos)



fora do Oscar, mas não menos interessantes, estreiam "O Amor e Outras Drogas", com os bonitões Anne Hathaway e Jake Gyllenhaal, e "Um Lugar Qualquer", novo filme de Sofia Coppola, uma das minhas cineastas preferidas - ao menos, ela dirige alguns dos filmes de que mais gosto, como "Encontros e Desencontros" e "Maria Antonieta". No domingo, devo assistir dois dos filmes em cartaz na cidade.



fora do universo cinematográfico, na área teatral, vale ficar de olho em "Rosa de Vidro" (assistirei amanhã à montagem, que está com ingressos esgotados), "12 Homens e uma Sentença", "Dueto para Um", "Nãotemnemumnome" e "Senhora de Dubuque", que estreia no Sesc Pinheiros, levando ao palco Karin Rodrigues.



entre os shows, o Sandália de Prata lança mão de músicas clássicas do samba-rock em show na convidativa choperia do Sesc Pompeia, amanhã, quinta. Para quem curte Carnaval, Banda Eva promove o projeto EvaNave, no Estância Alto da Serra, no sábado (eu vou! hehehehehehe).



e está chegando ao fim a mostra "Lugares, Estranhos, Quietos", de Wim Wenders, no Masp. Devo aparecer por lá no domingo...



e o melhor da semana passada foi o espetáculo "Resta Pouco a Dizer", que estava em cartaz no Sesc Consolação. Mesclando linguagem teatral, vídeoarte e performances, a peça apresenta três textos curtos de Samuel Beckett. A iluminação e as interpretações dos atores são ótimas. Vale ainda mencionar as soluções cenográficas de "O Amor e Outros Estranhos Rumores", do mineiro Grupo 3 de Teatro, que está em cartaz no Tuca. Sem contar, ainda, a atuação ímpar de Melissa Leo em "O Vencedor".



é isso

espero encontrá-los por aí!

até mais

se cuidem!

alan

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Juridicamente impossível (parte IV)

Sentados no corredor que dava para as várias salas do centro velatório, Júnior e os outros amigos viram alguém aproximar-se numa cadeira de rodas. O rapaz parou ao lado deles e perguntou:
- É do Flávio?
Ante a afirmativa ele manobrou rapidamente a cadeira e entrou sem nem agradecer.
- Vocês conhecem?
- Há anos não víamos o Flávio, faz bem uns quinze anos que não o encontramos. Você sabe o que houve?
- Não sei de nada. Acho que foi repentina.
Por volta de meio dia sentiram fome. A moça bonita e o homem na cadeira de rodas conversavam baixinho há muito tempo, totalmente esquecidos do falecido.
Deveriam avisá-los de que iriam almoçar? Melhor, chato deixar o Flávio sozinho. Júnior aproximou-se do amigo e falou baixinho como se rezasse.
- Cara, seu enterro está muito fraco. Espero que não tenha encomendado a festa para muita gente. Só o Edmo, o Ge e eu, a mulher bonita e um cara numa cadeira de rodas. Seu plano furou, cara! Vou comer alguma coisa e já volto.
Nesse momento, toca o celular do "morto". Este fica em dúvida se atende ou não, mas, percebendo que a mulher está distraída conversando com o cadeirante, resolve atender, até porque poderão pensar que é o telefone de Júnior que tocou. Sussura:
- Alô!
- É do serviço de sepultamento do cemitério e quero avisar que o jazigo está pronto e as carneiras foram abertas. Qual o horário do sepultamento?
- Ok! Vou confirmar o horário. As despesas foram pagas, e o atestado de óbito chegou?
- Positivo para despesas, negativo para o atestado.
- Então me ligue quando estiverem com o atestado em mãos – desliga.- Desculpe a interrupção, cara, acho que as pessoas virão, aposto.
Se tivesse apostado Flávio ganharia. Quando Júnior voltou do restaurante, uma hora depois, o velório estava lotado. Todos conversavam animadamente. Muitos conhecidos, turma de faculdade, mulheres lindas, várias com óculos escuros usavam lencinhos para limpar lágrimas.
Até que Flávio era popular, mesmo. O que aconteceria quando revelasse tudo?
Repentinamente alguém pergunta:
- É pra fazer a encomendação?
Debochado, Júnior responde:
- Se a encomenda já estiver paga tudo bem...

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011