terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Juridicamente impossível (parte IV)

Sentados no corredor que dava para as várias salas do centro velatório, Júnior e os outros amigos viram alguém aproximar-se numa cadeira de rodas. O rapaz parou ao lado deles e perguntou:
- É do Flávio?
Ante a afirmativa ele manobrou rapidamente a cadeira e entrou sem nem agradecer.
- Vocês conhecem?
- Há anos não víamos o Flávio, faz bem uns quinze anos que não o encontramos. Você sabe o que houve?
- Não sei de nada. Acho que foi repentina.
Por volta de meio dia sentiram fome. A moça bonita e o homem na cadeira de rodas conversavam baixinho há muito tempo, totalmente esquecidos do falecido.
Deveriam avisá-los de que iriam almoçar? Melhor, chato deixar o Flávio sozinho. Júnior aproximou-se do amigo e falou baixinho como se rezasse.
- Cara, seu enterro está muito fraco. Espero que não tenha encomendado a festa para muita gente. Só o Edmo, o Ge e eu, a mulher bonita e um cara numa cadeira de rodas. Seu plano furou, cara! Vou comer alguma coisa e já volto.
Nesse momento, toca o celular do "morto". Este fica em dúvida se atende ou não, mas, percebendo que a mulher está distraída conversando com o cadeirante, resolve atender, até porque poderão pensar que é o telefone de Júnior que tocou. Sussura:
- Alô!
- É do serviço de sepultamento do cemitério e quero avisar que o jazigo está pronto e as carneiras foram abertas. Qual o horário do sepultamento?
- Ok! Vou confirmar o horário. As despesas foram pagas, e o atestado de óbito chegou?
- Positivo para despesas, negativo para o atestado.
- Então me ligue quando estiverem com o atestado em mãos – desliga.- Desculpe a interrupção, cara, acho que as pessoas virão, aposto.
Se tivesse apostado Flávio ganharia. Quando Júnior voltou do restaurante, uma hora depois, o velório estava lotado. Todos conversavam animadamente. Muitos conhecidos, turma de faculdade, mulheres lindas, várias com óculos escuros usavam lencinhos para limpar lágrimas.
Até que Flávio era popular, mesmo. O que aconteceria quando revelasse tudo?
Repentinamente alguém pergunta:
- É pra fazer a encomendação?
Debochado, Júnior responde:
- Se a encomenda já estiver paga tudo bem...

Nenhum comentário: