desde pequena, solidão sonhava em ser professora - influência direta da mãe, distância, que lecionou durante anos e anos no colégio da cidade.
magrinha, cândida, áurea de paz e de sorriso sempre colado ao rosto (parecia ter nascido com ele), não tinha um (aluno, pai, professor) que não se encantasse por ela.
dava aulas aos pequenos - que, além das primeiras letras e operações matemáticas, descobriam os primeiros sintomas da paixão em sala de aula - claro, isso não constava no conteúdo programático.
e não só os meninos. as meninas também.
não sabiam se era a saia sempre no joelho, que escondia as coxas (era um exercício de imaginação delicioso fazer a imagem do corpo da solidão por baixo dos panos), mas sempre deixava marcar a bunda ao virar-se de costas para a classe.
talvez fossem as blusinhas, meigas, disfarçando os seios perfeitos, mas que pareciam implorar para ser arrancadas do corpo de imediato.
quem sabe a fala mansa, parecendo sussurrar "me deseje" a cada bom dia ou mesmo pedido de silêncio.
poderia até ser o jeito de olhar, castanho, direto, desconcertante, a fuzilar concentração - eu juro, tinha gente que desviava o rosto para não ser atacado por um desses e cair na armadilha desse amor, platônico e impossível, mas sem volta.
não sabiam.
o que se sabia é que todos se apaixonavam por solidão.
e solidão não dava bola pra ninguém. ninguém mesmo.
à boca pequena, corria que um amor juvenil trouxe lágrimas demais. a partir desse dia, solidão resolveu se dedicar apenas ao trabalho. nem bicho de estimação ganhava mais o coração da jovem professora.
agora, as lágrimas vinham das crianças, com o final do ano letivo.
todas apaixonadas. todas querendo vivenciar, no auge de uma inocência doce, fagulha do bem-querer da professora.
que ria.
solidão achava graça dos presentes, das declarações nas provas e trabalhos, nas cartinhas colocadas à mesa durante o recreio, dos pequenos que faziam questão de serem reprovados para continuarem ali por mais um ano.
não se abalava. nunca. o mesmo jeito cândido. o mesmo sorriso.
todo ano era assim. ao soar do sinal da entrada, é hora de se apaixonar. ao soar do sinal do fim das aulas, cada um leva consigo um pouco da solidão.
é o dever de casa.
5 comentários:
acho que fiquei de castigo depois da aula... rs... lindo texto! bjs
bom ver vc
Belo post Thiago!
Encantador!
Um abraço!
Adorei o texto, Thiago!
Rosa
Demais. O monstro do niilismo fofo continua craque nas tragédias do coração. Adoro.
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