quarta-feira, 6 de maio de 2009

Noite de domingo e a corda bamba.

Noite de domingo, 3 de maio de 2009. Aproximadamente 17:50 da tarde. Ao longe o estampido sequencial dos tiros de rojão deixavam claro que o Corinthians havia saído campeão. Eu caminhava vendo alguns corinthianos implorando para que os donos das bancas de jornal próximas ao parque Triannon ligassem as televisões das barracas:
- “Deixa de frescura homem...liga isso, coringão campeão invicto não é todo dia...”.

Conforme eu caminhava o frio ia aumentando, assim como o destacamento policial destinado a manter a ordem do fim de fim de semana na região da Paulista. Era evidente que se esperava uma bagunça generalizada nas imediações do Pacaembu, o que englobaria Higienópolis, Santa Cecília e Bela Vista. Mesmo curioso para ver no que ia dar o encontro dos felizes desordeiros com os mantenedores do establishment, mantive minha rota original. Uma pausa no café ao lado do Prainha Paulista para uma revigorante quiche de presunto e queijo com Pepsi e logo em seguida a chegada ao número 807 da Paulista.

O Cine Gemini fica escondido no meio de uma galeria, no estilo promenade, que atravessa de uma lado ao outro o quarteirão, ligando a Paulista à Alameda Santos. Para aqueles que estão acostumados aos cinemas com super booster master sound system e suas salas Stadium, a própria experiência de ir ao Gemini é desafiante. Os desavisados não verão qualquer letreiro em neon ostensivo, nem pipoqueiros vagando em frente à entrada. Aliado à este esconderijo, outra característica do Gemini é sempre pôr em cartaz filmes que há certo tempo deixaram as telas dos outros cinemas, mais afeitos aos blockbusters. Digno de nota é ainda a inigualável decoração das salas, exatamente a mesma há aproximadamente trinta anos. Coloque um globo de espelhos no meio da sala de espera e ligue uma caixa de som tocando Abba, e a impressão é de que Farrah Fawcett ou todas as Panteras aparecerão, dançando, subindo as escadas...

Uma moça de uns trinta anos - quem pressupus ser a equivalente de um lanterninha-pipoqueira-faxineira do estabelecimento, informou aos presentes que a respectiva sala já se encontrava aberta. A sala de projeção, imensa, é totalmente anacrônica se comparada às propostas atuais – o que faz dela simplesmente deliciosa (não obstante o assento da poltrona já estar completamente amassado pelo tempo e pelas inúmeras nádegas que dele usufruíram). Tons de um azul cujo nome não ouso imaginar vão desde o carpete até o teto, com motivos nitidamente lisérgicos que me fizeram não conter o riso ao subir as escadas.

Feita esta introdução, vamos ao que interessa. Um filme muito bem feito, documentando uma história magnífica, da qual eu somente tinha conhecimento por algumas fotos. A caminhada de Philipe Petit sobre uma corda (um cabo de aço, na verdade) ligando as Torres Gêmeas de Nova Iorque em 1974.

Este relato jamais poderia tentar sintetizar o filme, nem mesmo descrevê-lo, já que não me seria lícito privar meus leitores – reais ou imaginários – desta experiência. Somente ouso dizer o que senti ao assistir os 90 minutos de projeção. É indescritível, inefável para ser preciso, o potencial de redenção e de arte que está contido na loucura. Ou seria a parcela de loucura contida numa obra de arte? Não sabemos de Tostines vende mais porque é fresquinho, ou se é fresquinho pelo fato de vender mais.

Em tempos desesperados como o nosso, em que as grandes guerras são travadas por pequenos homens escondidos em montanhas longínquas, e em que os atentados terroristas causam destruição e morte, ter a oportunidade de ver o tamanho desvario redentor de Petit faz-nos ter claro que a arte pode atingir um grau de insanidade digno de semideuses. Petit cometeu um atentado. Com seis anos de preparação, e com toda a obsessão que deve acompanhar os mártires do islã ou do país basco, Petit tinha como objetivo atingir as torres gêmeas, mas não para destruí-las, como ocorreria quase trinta anos depois. Seu objetivo era unicamente utilizá-las como palco. O atentado de Petit foi um atentado contra a mesmice, contra a mecanicidade do mundo moderno e contra um mundo sem arte, sem alma, sem loucura e sem superação do que é considerado o limite humano.

4 comentários:

Unknown disse...

Pós-silencio!!!!!!!!!!!!!
Janira

Janaina Fainer disse...

estou louca para ver o equilibrista

Rosa Bertoldi disse...

Meu olhar cinematográfico também.
Vou vasculhar as locadoras de Bauru para ver se encontro. Parabéns ao moço de São Paulo?????
Acho boa essa coisa de sete graus de separação, pois só conheço minha xará a Rosa Leda, mas um dia a gente acaba se encontrando para um bom papo blogueiro, eu espero.

Anônimo disse...

Thiago relacionou muito bem a vitória corintiana com a vitória de Philippe Petit. O que ambas têm em comum? A paciência. Philippe é o príncipe da espera paciente, da preparação, do equilíbrio. E nisto o campeão paulista foi insuperável. Esperou anos a fio para ser campeão invicto e outros menos para ser campeão dos campeões. Parabéns Thiago.