sábado, 27 de junho de 2009

Orfeu


Li uma definição para museu e fiquei encantada com a sensibilidade de Marília Xavier Cury. “Museu é filho de Orfeu. Orfeu cujo mito é o mais complexo e extenso que há na Grécia.” Para a autora, museologia é: “o resultado das ações do museu ao recolher os fragmentos da poesia que está nas coisas,” no patrimônio cultural, eu diria. O museu possui o “olhar seletivo” de seu pai Orfeu e como ele é um poeta.
Pensei no outro Orfeu, o da Conceição, texto de Vinicius de Moraes, classificado como tragédia carioca. Ele revelou no prenome do protagonista a intenção de reviver um mito, transferindo os acontecimentos para um morro da cidade do Rio de Janeiro.
O primeiro ato foi escrito em 1940, mas a peça foi concluída 13 anos depois. Encenada em setembro de 1956 transformou-se em redundante fracasso. Orfeu da Conceição tornou-se mundialmente famoso através do filme francês Orfeu Negro baseado no texto de Vinicius e filmado no Brasil, sob a direção de Marcel Camus. Existe um outro filme Orpheé, de Jean Cocteau, onde ele transpõe o mito, literalmente.

Orfeu da Conceição: uma tragédia carioca não foi fiel à mitologia grega.
a) No relato mitológico Clio não era mãe de Orfeu e sim amiga de Cirene, mãe de Aristeu. Os pais de Orfeu foram Calíope e Apolo.
b) Orfeu e o assassino de Eurídice têm o mesmo pai na tragédia grega.
c) Irmão, na gíria carioca conota amizade. A palavra irmão, no caso do filme não obedece à mitologia, só a essência das personagens: ambos são amigos fraternais. Aristeu torna-se oponente de Orfeu por causa de Eurídice, amada por ambos.
d) Plutão e Perséfone, sua mulher são os nomes dos senhores das regiões infernais. No mito Orfeu vai ao inferno em busca de Eurídice, após acordo conseguiu resgatá-la com a condição de não olhar para trás. Preocupado com a amada virou-se e o vulto desapareceu. Na peça Orfeu vai aos Maiorais do Inferno (metaforicamente ultrapassou os limites humanos, foi ao inferno...). Na versão de Diegues a morte aparece como a Dama Negra e o inferno é o abismo ao redor do morro, um cemitério clandestino.
e) No mito, Eurídice é picada por uma serpente. Na peça, Aristeu apunhala a moça, e no filme, ele atira nela acidentalmente.
f) O mito de Orfeu prolonga-se no tempo, na figura de Orfeu da Conceição.
g) (Apolo: Toca muito o meu filho, até parece/Não um homem, mas voz da natureza...)
h) Coro: Para matar Orfeu não basta a Morte.
Tudo morre que nasce e que viveu
Só não morre, no mundo a voz de Orfeu.


Orfeu o primeiro cantor do mundo tem inspirado a música, a literatura e a cinematografia mundiais, em virtude da universalidade de seu tema. Vinicius de Moraes prestou uma homenagem aos cantores negros do morro carioca, local onde supostamente nasceu o samba. Puxa, será que por causa do museu, teria eu viajado na maionese, como dizem os jovens?

2 comentários:

Janaina Fainer disse...

nossa, acho esse filme uma bomba
mas até o aí o Cacá Diegues tem um histórico de erros bem maior que o de acertos
só a trilha que é boa
hei, por isso vc gosta do filme, porque a trilha é do Caetano Veloso
olha ele aí cantando (bem melhor que o Toni Garrido) a música tema
http://www.youtube.com/watch?v=xT22dcHjsOE

Rosa Bertoldi disse...

Janaina:
Eu não disse que o filme era bom!
Mas, eu particulamente gosto muito de todos eles, três no total, sem contar a peça.
E sim a trilha do filme do Garrido/Cacá Diegues é do Caetano.
Ela é linda não é? E gosto muito de mitologia misturada com história da arte.Os velhos mitos são tão atuais, que o diga Freud, não é?
Bjs