quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Panopticon...

Na noite do último domingo eu me tornei um velho. Esse fenômeno, de fato, não me surpreendeu. Já via esse Thiago velho, na penumbra, se aproximando lentamente, caminhando disfarcadamente em minha direção. Mas foi no domingo que, num descuido meu, ele deu o bote e eu, após alguns segundos, me dei conta da fragilidade de meu esqueleto psicológico (o físico ainda está bem, obrigado).

A velhice se mostrou para mim, ali escancarada, na capa de uma revista semanal. Não que houvesse uma foto de uma casa de repouso, nem senhorinhas tomando sol matutino defronte suas residências, guardadas pelo olhar zeloso de um enfermeiro mal remunerado. Nem mesmo uma única palavra sobre Alzheimer. A velhice se mostrou pra mim fazendo-me sentir medo do futuro, talvez não do meu, mas do da humanidade. A imagem da manchete principal da revista Veja gelou-me a espinha. O conteúdo da reportagem, me fez ter certeza de que, como disse Goya há mais de duzentos anos, “El sueño de La razón produce monstruos”.

A matéria previa um futuro (ansiado, desejado e sentenciado como inescapável por parte da revista) em que a tecnologia – essa ferramenta que usamos aqui, para nossa comunicação e deleite – estaria em todos os lugares de nossa vida, nas roupas, relógios, tênis, nas embalagens dos produtos dentro de nossa geladeira. Estaria em nossos órgãos, em nosso fígado biônico comprado à prestações e capaz de não sintetizar alguma substancias conforme indica o manual, estaria em nosso olho scanner marca Carl Zeiss que, além de ver, tira fotos, filma e já vem com Photoshop. Enfim, em absolutamente tudo. Todos estes aparelhos/acessórios/brinquedinhos de Belzebu seriam inteligentes, e capazes de níveis incipientes de raciocínio.

Como todos teriam, além da inteligência, capacidade de comunicação numa rede de informações (todos os microprocessadores destes aparelhos seriam conectados à uma internet sem fio e sem fim), todos os nossos dados, de pressão sanguínea a posicionamento em latitude e longitude no globo, seriam monitorados por esta “matrix light”, e reduziríamos o acaso e o imponderável a níveis nunca dantes imaginados e, portanto, não humanos (ao menos de acordo com a concepção de humanidade que carrego para mim). Estaríamos, enfim, controlados, selecionados, catalogados, e encaixotados (socialmente). A revista, por mais bizarro que isso possa parecer, aprova e incentiva esta “evolução”.

Lembro que o medo do novo, o descontentamento com os rumos que a humanidade passa a percorrer, foram sintomas da quase imperceptível senescência de meu pai. Ao ver coisas banais, vituperava sobre tudo- de modo discreto -, da moda das garotas ao formato abaulado dos carros de hoje em dia, sem caudas em forma de peixe nem “personalidade”. E creio que domingo, tive essa mesma sensação, acrescida da impressão de que poderei ver e ser vítima desta ditadura tecnológica que se nos começa a avizinhar.

Aos que assim como eu se sentirem aterrorizados por tais possibilidades, gostaria de indicar o novo ciclo de palestras “Mutações”, que ocorrerá em São Paulo, entre os dias 19 de agosto e 09 de outubro, no Sesc Paulista. O ciclo pretende analisar o lugar da experiência do pensamento num mundo conduzido à força da tecnociência, e que tornou as categorias do pensamento obsoletas. Como se faz, então, a experiência do pensamento no mundo dominado pela performance e pela tecnologia? Vale a pena.

Até breve.

4 comentários:

Rosa Leda disse...

— O que faz nas horas de folga, Montag?
— Muita coisa, senhor... corto a grama...
— E se fosse proibido?
— Ficaria olhando crescer, senhor.
— Você tem futuro.
Esse diálogo, do filme Fahrenheit 451,adaptação cinematográfica do romance homônimo de Ray Bradbury, dirigida por François Truffaut em 1966 fez furor no século passado. Nele, num tempo futuro, sob regime totalitário as pessoas não podiam ler. Todos os livros eram queimados. Se você anda preocupado, leia. Seu texto é magnífico. Parabéns!

Rosa Bertoldi disse...

Prezado:
Fiz um comentário sobre o filme Matrix onde levanto a questão do homem/máquina ou homem/deus. Estamos quase chegando lá. Ainda bem que foi um jovem a tocar no assunto, senão iriam dizer que eram as gagueiras de uma senhora...
Parabéns!!!!!!
Rosa Bertoldi

R. Gabrielli disse...

Thiago, meu comentário ficou esquisito. Parece que eu estaria recomendando a você que lesse, como se vc não o fizesse. Não é isso (embora pareça). Como o filme é muito antigo e você não, a sugestão era de que você assistisse ao filme ou lesse o belíssimo e nem tão ficcional quanto o autor desejaria, livro. Bj

Janaina Fainer disse...

Thiago, estive com a Marina e ela mandou um beijo
e eu mando outro
ate mais