O que faz com que alguns seres humanos insistam em viver, enquanto outros se contentam em existir? Por mais tendenciosa que a questão seja, não se pode deixá-la em silêncio.
Inevitável voltar às questões surgidas no ultimo post. Se tenho alguns argumentos em meu acanhado repertório até aqui angariado, sinto que é momento de dividi-los. E no começo (vez que o começo é sempre imprescindível, ainda que tendencioso) faço uso de Aldous Huxley. Lembrei-me do dialogo em que John, o selvagem, interpela (ou é interpelado) pelo chefe, Mustafá Mond. Nesta passagem, o selvagem, após ouvir as inúmeras qualidades e vantagens do mundo criado pelos e para os alphas, afirma: “eu quero sofrer!!!”.
Pergunto: Haveria, ou ao menos persistiria, a condição humana se estivéssemos desprovidos do sofrimento. Se estivéssemos totalmente protegidos, controlados e tutelados por uma superestrutura (cacoetes marxistas!) que nos impedisse de desobedecer e, conseqüentemente, de sofrer e de existir. Haveria o homem, o Don Quixote, o Bardo Shakespeariano, a Verônica de Paulo Coelho, ou o Santo Cristo de Renato Russo? Brecht, Becket, Tenesse Willians, Freud e Hanna Arendt?
Se me é facultado dividir uma impressão, é a de que duas coisas definem o humano: a dor e a incompletude. A dor é a conseqüência inevitável de nossa finitude, de nossa não-onisciência e da relação do homem com o imponderável. E é essa mescla com o imponderável que nos faz humanos. Portanto, a tentativa do controle não nos retira a angústia. Apenas gera a opressão. Jamais satisfação, desejo humano irmão da fome.
A confusão deste escrito não é intencional, não sendo todavia algo que me considero capaz de evitar. É fruto da mesma angústia (desejada e deliciosamente sorvida) de minha condição humana. E para completar a confusão, lanço mão de uma letra que parece condensar o sentimento de ser sufocado por algo maior e incontrolavel.
“Como beber Dessa bebida amarga
Tragar a dor Engolir a labuta
Mesmo calada a boca Resta o peito
Silêncio na cidade Não se escuta
De que me vale Ser filho da santa
Melhor seria Ser filho da outra
Outra realidade Menos morta
Tanta mentira Tanta força bruta...
Como é difícil Acordar calado
Se na calada da noite Eu me dano
Quero lançar Um grito desumano
Que é uma maneira De ser escutado
Esse silêncio todo Me atordoa
Atordoado Eu permaneço atento
Na arquibancada Prá a qualquer momento
Ver emergir O monstro da lagoa...
De muito gorda A porca já não anda
De muito usada A faca já não corta
Como é difícil Pai, abrir a porta
Essa palavra Presa na garganta
Esse pileque Homérico no mundo
De que adianta Ter boa vontade
Mesmo calado o peito Resta a cuca
Dos bêbados Do centro da cidade...
Talvez o mundo Não seja pequeno
Nem seja a vida Um fato consumado
Quero inventar O meu próprio pecado
Quero morrer Do meu próprio veneno
Quero perder de vez Tua cabeça
Minha cabeça Perder teu juízo
Quero cheirar fumaça De óleo diesel
Me embriagar Até que alguém me esqueça”
Esta, talvez, nossa síntese tupiniquim. E com méritos!
Um comentário:
Thiago!
Parabéns!!!!
Janira
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