segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Melancolia

Tentou lembrar da alegria sentida tão intensamente até um tempo atrás, balançando tímida os quadris pesados.
Sem olhar para os lados, que o olhar dos outros a deixava envergonhada, levantou os braços mostrando suas axilas claríssimas (usava um novo produto anunciado na TV, que as torna maravilhosas e dignas de serem admiradas) e lembrou das artistas que tiram o “gordo” com uma plástica de rápida recuperação (ficam fundas e sedutoras e pode-se pagar em dez parcelas)... mostrou seu gordo axilar tentando entrar no ritmo.
Improvisara uma fantasia. Ao espelho aprovara a escolha, mas agora parecia um pouco brega. Ainda bem que a máscara, home-made, cobria um pouco do rosto. Alguém a reconheceria?
Só se fosse pela sandália desconfortável com a plataforma enorme, meio fora de moda e usada todos os anos para cair na folia...
A sensação de estar artificial não a abandonava. Que alegria é essa que não sinto? Será que sou só eu, ou todo mundo está fazendo tipo? Se ao menos tivesse vindo com um bloco! Em bando tudo fica mais fácil, cria-se a ética do grupo.
Droga! Se vim, vou aproveitar.
Abriu um sorriso sedutor, ajeitando provocadoramente a máscara e segurando entre os dedos a piteira, muleta usada para circular pelo salão.
“É com esse que eu vou sambar até cair no chão,/
é com esse que eu vou desabafar na multidão/
Se ninguém se animar eu vou quebrar meu
tamborim/ mas se a turma gostar vai ser pra mim”.
Ainda bem que tocavam músicas antigas. Se além de tudo fosse obrigada a ouvir que o “Bruce tava magoado porque Bruce tinha paixão...”, arrancaria a máscara e fugiria, negando o sangue brasileiro nas veias, cortando os pulsos se preciso fosse, mas gritaria bem alto:
– Carnaval? Tô fora!
Bem melhor ler poesia na rede da fazenda.

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