terça-feira, 1 de março de 2011

Intromissão

Hoje encontrei este texto do Walcyr Carrasco, como o nome de Natalie está em todo lugar por causa do Oscar, achei oportuno colar, mesmo não sendo meu dia.


REPULSA AO SEXO E CISNE NEGRO: AULAS DE INTERPRETAÇÃO
Walcyr Carrasco

Muitos atores acham que interpretação é gritar, berrar, se arranhar e eventualmente quebrar o cenário. Não nego que grandes cenas foram obtidas através desse paroxismo de emoção. Mas tenho paixão por atores e atrizes que conseguem, com menos, fazer mais. É o caso de Natalie Portman em “Cisne Negro”. Bem que mereceu o Oscar. A personagem vai surtando e a gente percebe através de olhares, intenções. Mas, o que é importante, o trabalho é sutil. Torna-se crível que suas colegas e o personagem do coreógrafo não percebam que ela está pirando. Nós percebemos, e sabemos que isso vai terminar mal. Mas quem trabalha com ela vê uma bailarina dedicada diante do seu primeiro papel estelar.
A interpretação de Natalie Portman me remeteu a outra grande interpretação do gênero: Catherine Deneuve em “Repulsa ao Sexo”, de 1965. (O título original do filme é “Repulsion”, mas na época o tradutor brasileiro achou mais vendável “Repulsa ao Sexo”. Coisa ridícula que se faz ainda hoje em dia. Como ficaria “Black Swan” se traduzissem desse jeito? Talvez ” O Cisne Erótico”.)
Em “Repulsa” Catherine Deneuve, novinha (o filme é em preto e branco) também surta. E constrói o papel milimetricamente, como Natalie. São os olhares, os gestos controlados que vão dando a dimensão da loucura da personagem. Catherine Deneuve tornou-se uma estrela com uma interpretação mínima e intensa, em todos os filmes subsequentes. Natalie ganhou o Oscar.
Vale a pena assistir a “Repulsa”, hoje um filme quase esquecido. E comparar as interpretações. Mesmo porque o mote que leva ambas as personagens à loucura é o mesmo: a confrontação com a própria sexualidade. Acho legal para atores, atrizes, ou candidatos a. Ou para quem ama grandes interpretações como eu.
Ah, sim, a direção de “Repulsa” é de Roman Polanski, antes de seu sucesso nos Estados Unidos, dos processos, etc etc.
E ninguém ache que é uma crítica pessoal, já que, como autor, vivo mergulhado no universo de atores e atrizes. Nós, latinos, gostamos de abrir um berreiro, puxar os cabelos, dar bofetadas e tudo mais nas grandes cenas. É legal descobrir como se pode fazer o contrário e conseguir uma interpretação absolutamente emocionante.

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