quinta-feira, 11 de setembro de 2008

doce

ela entrou na doceria.
criança ainda. sorriso com dente de leite.
pediu amor.
o vendedor não entendeu.
-- amor não é doce, menina, tentou argumentar.
-- claro que é. minha vó disse, minha mãe disse, minha irmã disse.
-- elas estão erradas.
-- não estão.
-- ó, leva ilusão. é superdoce, o único problema é que termina rápido, precisa levar várias.
-- não, quero amor.
-- tem saudade. só que é raro, coisa cara, mas vale o investimento.
-- não.
-- num prefere paixão? é um pouco enjoativo, mas mata a vontade do amor...
-- quero amor.
-- tá vendo aquele pirulito todo colorido? é decepção. se você comer devagar...
-- moço, quero amor.
-- mocinha, trabalho aqui há mais de 30 anos. sempre vendi amor. todo mundo acha que é um doce. mas não é. todo mundo briga comigo depois.
-- num faz mal. quero amor.
o vendedor se entrega.
-- ok. toma. esse é o amor. e vou lhe dar de graça.
-- nossa, pequeno assim?
-- é, não rende muito.
-- não posso levar dois?
o vendedor ri.
-- olha, leva o primeiro, experimenta e, se gostar, eu te dou mais. será nosso acordo.
-- tá.
a menina saiu com o doce nas mãos. chegou até a calçada.s
orriu. e não resistiu.
pegou o doce, levou à boca.
tomou um encontrão do moço apressado.
o doce caiu. um cachorro sarnento mordeu.
engoliu numa bocada.
rosnou, foi embora.
ela chora.
volta à loja.
pede ao vendedor, entre soluços e tristezas:
-- me dá uma paçoca?

2 comentários:

Carolina Sperb disse...

paçoca ao amor?
uma boa escolha...
porém, ela pode comer o que quiser que nada vai fazer a vontade do amor ir embora!

adorei o texto.
beijo
cuide-se sempre!

Mariah disse...

na verdade ele é exatamente isso. uma verdadeira ilusão...bem mais bonito na "vitrine" do que na "boca".