quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

?

dia de fuzilamento. alinham-se no antigo muro dúvidas e questionamentos.
não se permite mais perguntar. as interrogações estão banidas dessa cidade feito leprosos.
não há motivo para confusão.
não há razões para desentendimentos.
não há tema para discussão.
as perguntas, feito putas de batom vivo e panos baratos, não se equilibram mais em salto alto pelas esquinas, oferecendo-se aos carros e aos imbecis.
vez ou outra, um anúncio no classificado chama a atenção.
questionar sem camisinha. além de imoral, o ministério da saúde adverte.
se alguém tem uma dúvida, guarda pra si. se fizer mal, que vá fazer terapia. que vá chutar um cachorro sarnento.
que meta uma bala na cabeça.
mas não encha o saco autoritário dos cheios-de-si que comandam o dia-a-dia.
os questionamentos mais antigos, que já lutaram pelo país na segunda guerra, não têm mais direitos.
nem eles. e foda-se o estatuto.
e a gramática também.
movimento a favor das exclamações. e das reticências.
ruas invadidas. interrogações linchadas. enterradas em vala pública.
aquele anzol de ponta-cabeça é coisa do demônio.
esse sim, pestilento. cão sem mãe. gosta de colocar pergunta na cabeça de gente boa.
gosta de uma dúvida. gosta é do estrago. aleluia.
não importa mais se ela te ama, se a carne está no ponto, se amarelo é a cor da estação.
nem se o calçado é 38, se o rio tem piranha, se o gol foi de mão.
tira a sujeira dos óculos e volta a escrever. e que saiam apenas certezas publicadas no jornal de amanhã.
nada de lamentos retirados do antigo muro.
que ouve todos os últimos desejos, todos em forma de questão, todos gritados silenciosamente.
neste eco de incertezas, todos se calam.
às dúvidas, restam apenas os corações solitários como porto seguro.
e, em questão de tempo, sem vida.
e não pergunte o porquê.

[inspirado no "livro das perguntas", de pablo neruda. thaís nucci, obrigado pelo presente]

3 comentários:

Janaina Fainer disse...

voltou com força total
lindo texto
e q 2009 seja um arraso
bjs

Priscila Virginio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Priscila Virginio disse...

Desmostração de uma mente brilhantemente confusa. E graças a deus mesmo!
Parabéns pelo texto.