quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

miniconto sobre a arte de despertar

tem dias que ela acorda de ressaca.
em outros, chorando.
já acordou assustada, com medo.
de vez em quando, acorda feliz (é raro, mas acontece).
em outros, quer enforcar alguém.
quase sempre, acorda reclamando da vida.
quase sempre, reclama da vida e do cabelo.
é comum amaldiçoar o homem da noite anterior, nenhum bilhete no criado-mudo.
xinga o despertador.
xinga o chinelo, que insiste em correr pra debaixo da cama.
xinga o secador de cabelo do vizinho, travesti.
mas, hoje, foi diferente.
ela acordou.

só isso.
e mais nada.
acordou.
nenhum sentimento.
nenhum reconforto.
nenhum sinal de porra nenhuma.
nadica.
pela primeira vez, percebeu a solidão, tirando um cochilo ao lado.

3 comentários:

Camilla Tebet disse...

Adorei a figura da solidão tirando um cochilo... Adorei.

Anônimo disse...

Parabéns pelo miniconto, por conferir à companheira o direito ao cochilo.

Historicamente, um ganho muito grande.

Antigamente era comum ouvir:

"A abelha mestra não tem sesta"

ou

"A abelha mestra não tem sesta e se a tem pouca e depressa".

Os homens não perdoavam a mulher cochista. Mas, para cochar e colar é só cochilar, porque cochar e colar estão em cochilar.

Sérgio Rizi

Rosa Bertoldi disse...

Parabéns!!!!
Rosa Bertoldi