sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

DESTERRO NA REPÚBLICA DOS CORONÉIS

Embora tenha havido desterro quando do golpe praticado no governo de Floriano Peixoto, em 10 de abril de 1892, foi no início do século passado, no governo republicano de Artur Bernardes (1902- 1906), que foi abundantemente utilizado, mediante decretação de estado de sítio,  o uso desse instrumento, com o propósito de  principalmente reprimir e assustar a classe operária que reivindicava  melhorias trabalhistas, inclusive salariais. Era tratada da mesma forma que os assassinos e ladrões encarcerados a serem desterrados. O governo aproveitava esse momento para afastar da cidade do Rio de Janeiro, os descontentes com ele, bem como elementos da classe pobre e os mendigos.
 Paulo Sérgio Pinheiro no livro “Estratégias da ilusão”, narrando sobre o depoimento de um antigo ministro da Agricultura, Miguel Calmon Du Pin e Almeida, assinala que “desde o início da República” essas medidas “deviam ser feitas”, encaminhando esses desafetos “do Sul para as zonas de fronteira nos e
stados do Pará e Amazonas, talvez em virtude do princípio constitucional que atribui à União jurisdição sobre aqueles trechos do território nacional”. Recorrendo aos informes da imprensa da época, o ministro completa: “Ali amontoados na maior promiscuidade”  (nos navios de transporte) “crianças e velhos, negros e brancos, nacionais e estrangeiros, deitados uns, outros de pé, seguros fortemente, de mãos ambas, nos óculos das espias, procuravam respirar, faziam esforços sobrenaturais para sorver o ar puro do exterior,que dificilmente penetrava pelos interstícios... Nos porões nem uma luz! Os 334 condenados, quase nus, debatiam-se nas trevas com as enormes ratazanas, que silenciosamente os atacavam, cobrindo-os de dentadas.” Depois que o navio transpôs a barra, “nos porões os presos sem apoio rolavam uns sobre os outros, magoando-se, escorregando na lama nauseabunda de fezes e vômitos”.
No local inóspito do desterro, poucos sobreviviam, sendo a maioria eliminada pelas doenças contraídas naquele local ou por falta de abrigo ou alimentação.
Pinheiro, citando trechos colhidos no jornal “Correio da Manhã” de 23 de março de 1905, comenta: ”A verdade, entretanto, é que não foram arrastados até os calabouços da ilha das Cobras e de lá retirados para os porões dos navios que os conduziram aos inóspitos sertões do Amazonas, criminosos e desordeiros, ladrões habituais e outros indivíduos perigosos e nocivos. Muitos dos desgraçados só tiveram contra si o ódio e a malquerença de delegados e agentes subalternos da polícia que se aproveitaram do sítio para ajustar e saciar vinganças; outros foram vítimas da maldade de delatores, de cujas denúncias a polícia não se deu ao trabalho  de averiguar a veracidade”.
Mo mesmo livro comenta que o “governo Bernardes”... promovia a “limpeza da cidade, como a realizada em 1904 e descrita por Lima Barreto: A polícia arrebanhava a torto e a direito pessoas que encontrava pela rua. Recolhia-as às delegacias, depois juntavam na Polícia Central. Aí, violentamente, humilhantemente, arrebatava-lhes os cós das calças e as empurrava num grande pátio. Juntadas que fossem algumas dezenas, remetia-as à ilha das Cobras, onde eram surradas desapiedadamente.”
Houve desterro também no sertão Noroeste. Os indesejáveis eram deixados no km. 48 da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil e, sem condições de retornar à cidade, eram eliminados pelos índios Kaigang.
Eis um resumo do terror governamental no início do século passado, que quase ninguém conhece e, lamentavelmente não é ensinado nas escolas, no sentido de nunca mais acontecer.


2 comentários:

rosabertoldi@gmail.com disse...

Vou ficar craque em história lendo os seus artigos. O Baptista está adorando!!!!!!!

Janaina disse...

Estou aprendendo muito.