quinta-feira, 7 de agosto de 2008

violão

e lá se foram 11 anos.
ele nem lembrava mais a última vez que pegou o velho violão no canto da sala para tocá-lo.
o cabelo comprido já tinha sido aposentado. um corte curto, a última moda em escritório-com-ar-condicionado, ditava as regras.
também não fazia idéia por que diabos olhou para o violão hoje e sentiu falta, feito carinho de mãe.
talvez culpa.
talvez saudade.
será que existe diferença?
ele não sabe.
em todo caso, pegou o violão. daquele jeito mesmo, velho e empoeirado.
colocou no colo. mão direita passeando pelas cordas, tal qual um corpo no sábado à noite, regado a vinho.
nada. não sabe o que fazer.
não sabe a gravata que combina, o remédio certo para dor de cabeça, o talher da salada a ser usado.
nessa ânsia, fez-se silêncio. sonoro. oco. único.
e doloroso.
ele olha os discos do neil young no chão.
o cheiro do café que vem da cozinha.
a tarde chata, sem sol nem chuva, que se apresenta, com vergonha, pela janela.
os gritos da vizinha com o pobre do cachorro.
a irmã, ainda pequenina, aprendendo a falar.
os fones de ouvido no chão, desplugados.
as estrelas que tantas vezes contou em noites de solidão.
o primeiro tombo de bicicleta.
fecha os olhos.os dedos se movem. rapidamente, encontram as cordas - meu deus, elas sempre estiveram lá...
sente um som.
sente acordes.
sente cor e gosto. se delicia com o banquete.
é música.
e reconhece a melodia.
está tocando uma canção de amor.

3 comentários:

Camilla Tebet disse...

Música e lembrança. Uma combinação de efeito hã poeta? Quando é possível tirar a gravata- mesmo que na imaginação- e tocar as cordas da emoção e do passado que pode querer presente, é hora de comprar um violão novo, não é? Agora, com a gravata e o ar condicionado, talvez um violão mais sofisticado, e dele tirar sons novos, que com certeza são resultado daqueles tirados com a vizinha gritando e irmão aprendendo a falar. Canção de amor também.
Adorei.

Carolina Sperb disse...

esse eu já conhecia.
esse eu já adorava ;)

beijo

Anônimo disse...

Que lindo.
Sem palavras.
É a primeira vez que vejo um não músico traduzir a música em palavras com tanta sensibilidade.
Música é mesmo ap1aixonante, né?
bjo da sua fã e paga pau
mas não fica se achando
hahahhaa
bjos