segunda-feira, 9 de março de 2009

O AGIOTA

Solteiro, econômico, caseiro, não encontrava muitas razões para gastar.

Viagens? Com TV a cabo, tantos canais, tantas emoções, ver tudo do conforto do seu sofá....francamente, viajar para quê? Além disso, nas viagens havia as tais brincadeiras. Não tinha vontade de quebrar gelo nenhum. Conhecer algum lugar, isso sim, conversar um pouco, só isso. Brincar, rir, fazer palhaçada não, não gostava disso. Observava as mulheres, como se sentiam à vontade! Às vezes sentia inveja.
Melhor ficar em casa. Cinema? Ia de vez em quando; as filas davam-lhe a certeza de que ver televisão era melhor.

No Banco o dinheiro se acumulava. Tinha jeito com dinheiro, aplicava certo por isso não sentia medo da aposentadoria. Viveria bem.



Um amigo lhe falou de seu aperto, da falta de crédito, do medo de perder o carro. Ofereceu-se: juros bancários, um pouquinho mais. Gostou da experiência.

Ficaram sabendo e começaram a procurá-lo. Sentia prazer, uma emoção e ansiedade desconhecidas. Nunca se envolvera com mulher nenhuma e imaginava se os apaixonados sentiam esse medo, essa vontade de ver de novo, a insegurança. Vai dar certo? Será que fiz bem?

Preenchera seus dias e juntara papéis.

Comprou uma escrivaninha com gavetas. Ficou feliz. Até então não tinha tido uma escrivaninha só sua. Sentiu o cheirinho de madeira lixada, gostoso!

Abria e fechava as gavetas só para sentir o cheiro. Estava apaixonado pelo cheiro. Os papéis ficavam em cima do tampo. Será que existia isso em perfume, uma essência?
Começou a entrar em perfumarias e pedir cheiro de madeira lixada. As atendentes solícitas mostravam, em papeizinhos brancos que abanavam antes de lhe entregar: amadeirados com frutas, amadeirados com cítricos, madeira antiga, nenhum nem parecido com o que queria.

Passou a viver muito ocupado: escrevia os dados daqueles para quem emprestava dinheiro, marcava os juros, vencimentos, pagamentos e procurava o cheiro.

A gaveta já não era tão perfumada e nada parecido estava à venda. Sentia falta.

Decidiu comprar outra escrivaninha em vez de perder tempo em perfumarias.
Ninguém entendeu, quando ele morreu. Por que teria 32 escrivaninhas em casa, todas cobertas por pilhas de papéis e com as gavetas vazias?

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