segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Frequentemente foi classificado como um "poeta maldito" e, de fato, em sua poesia evoca muitos poetas que são tradicionalmente considerados malditos, citando-os nominalmente grande parte das vezes. É o caso de Álvares de Azevedo, Antonin Artaud, Rimbaud, Sade e Pier Paolo Pasolini entre outros
Roberto Piva tornou-se cultuado pela sua poesia experimental e onírica, com referências que vão de Dante Alighiere à geração beat norte americana. Recentemente, toda sua obra foi republicada pela editora Globo em três volumes:
Um estrangeiro na legião
Mala na mão e asas pretas
Estranhos sinais de saturno

Ainda mais recente é o livro Paranóia, originalmente lançado em 1963 e republicado em 2009 pelo Instituto Moreira Salles. Nele, 19 poemas de Piva são ilustrados pela fotografia do artista plástico Wesley Duke Lee. Retrata uma São Paulo caótica e maldita. Roberto faleceu em julho passado.


Paranóia

Eu vi uma linda cidade cujo nome esquecio
nde anjos surdos percorrem as madrugadas tingindo seus olhos
com lágrimas invulneráveis
onde crianças católicas oferecem limões
para pequenos paquidermes que saem escondidos das tocas
onde adolescentes maravilhosos fecham seus cérebros
para os telhados estéreis e incendeiam internatos
onde manifestos niilistas distribuindo pensamentos furiosos puxam a descarga sobre o mundo
onde um anjo de fogo ilumina os cemitérios em festa e a noite caminha no seu hálito
onde o sono de verão me tomou por louco e decapitei o Outono de sua última janela
onde o nosso desprezo fez nascer uma lua inesperada no horizontebranco
onde um espaço de mãos vermelhas ilumina aquela fotografia de peixe escurecendo a página
onde borboletas de zinco devoram as góticas hemorróidas das beatas
onde os mortos se fixam na noite e uivam por um punhado de fracas penas
onde a cabeça é uma bola digerindo os aquários desordenados da imaginação

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