domingo, 13 de julho de 2008

Em essência

"O desafio do teatro é ser vivo, interessante e tocar as pessoas; ultrapassar o nível banal que assola o mundo inteiro, ir além da facilidade do sórdido."
Peter Brook



Fui ver Fragments do Peter Brook meio ressabiada. Odeio quando ouvi mil comentários antes de ver qualquer coisa. Gosto do frescor, da objetividade (ou absoluta subjetividade) e desapego de olhos e ouvidos desavisados. Depois de ver uma peça, filme, exposição, sento para ler tudo o que se disse, antes prefiro ser eu e meus sentidos. Gosto deles e tendo a acreditar neles. Claro que já me enganei. Passei anos sentindo pouco cheiro. Mas isso já é outra história.
Lá fui eu ao Sesc Santana ver o Beckett que tentei ver em Paris e não consegui pois não estava finalizado ainda. Vi Hamlet quando o diretor inglês radicado na França pisou em terras tupiniquins pela primeira vez. E era impressionante. Tenho problemas com montagem do drama do príncipe dinamarquês. Amo o texto e sou super crítica. Saí embasbacada com a intensidade da montagem.
Vi Tierno Bokar três vezes não por opção mas por trabalho. Calhei de estar na produção de parte do evento, fazer o quê? E não vi Sizwe Banzi Est Mort poque não consegui convite e/ou ingresso.
E o Beckett de Brook é justamente o que eu gosto. Verborrágico e perdido nas próprias palavras, no mal do mundo, na incomunicabilidade, na solidão desse mundão de Deus sem Deus. O essencial, a ausência de firula, a despretenção... é tudo lindo.
É essa simplicidade que comunica com a platéia, sem gobo, sem mapas fenomenais de luz, mas com verdade, é isso que faz com que o ser humano sentado no escuro se sinta ligado e entenda (ou não!) o ser humano vivido no palco e é isso que está faltando no nosso teatro paulistano de tipos e baladas. Está faltando verdade e sem verdade não existe teatro.

Fragments reúne os textos “Berceuse” (ou “Rockaby”, em inglês) “Fragment de théâtre I” (ou “Rough for Theatre I”), “Acte sans paroles II” (ou “Act Without Words II”), “Va et viens” (ou “Come and Go”) e o poema, “Ni l’un ni l’autre” (”Neither”).
Inicialmente apresentada em francês, em outubro de 2006 no Teatro Bouffes du Nord, a peça foi remontada em inglês no Young Vic Theatre em setembro de 2007. Em junho de 2008 apresentou-se (em inglês, com legendas em português) no Festival de Londrina (FILO), Brasília e São Paulo e Rio de Janeiro.

“Beckett era um perfeccionista. Mas, pode-se ser perfeccionista sem ter uma certa intuição do que é a perfeição? Atualmente, com o passar do tempo, percebemos a que ponto todos os rótulos que lhe foram atribuídos no passado - desesperado, negativo, pessimista - são falsos. Beckett, na verdade, mergulha seu olhar no abismo insondável da existência humana. Seu humor o salva - e nos salva - ele rejeita as teorias, os dogmas que nada oferecem além de piedosos consolos. Na realidade sua vida nada foi do que uma constante e difícil pesquisa da verdade. Ele coloca as pessoas exatamente como as vê, na escuridão. Ele as mergulha no vasto desconhecido, observando através das janelas delas mesmas, nos outros, o olhar dirigido tanto para o exterior como para o interior, para o alto ou para baixo. Ele compartilha da incerteza delas, de seu sofrimento. O Teatro lhe dá a possibilidade de encontrar uma unidade na qual o som, o movimento, o ritmo, a respiração e o silêncio estão reunidos com exatidão. Ele pede para ele mesmo - um objetivo inatingível, que se alimenta de sua necessidade de perfeição. Ele penetra dessa forma no caminho raro que religa o teatro grego e Shakespeare ao tempo atual - celebrando sem compromisso a verdade, uma verdade desconhecida, terrível, espantosa.”, afirma Peter Brook.

Sinopse

“Rough for Theatre I”
Um circunspeto músico cego e um animado deficiente físico preso a uma cadeira de rodas com capacidade de recuperar rapidamente a alegria alcançam a condição de mútua dependência rubugenta.

“Rockaby”
Uma mulher solitária tenta ninar a si mesma, literalmente, até morrer, tanto fisicamente e por meio da sua fala repetitiva.

“Act Without Words II”
Num drama sem palavras, dois personagens emergem de sacos gigantescos para se submeter a uma cômica rotina diária de trabalho duro em estilo de cinema mudo. Arrastam a si mesmos uns poucos centímetros à frente a cada “empurrão da vida”.

“Come and Go”
Três senhoras idosas estão sentadas num banco de parque. Cada vez que uma sai, as outras duas compartilham um terrível segredo sobre ela.

FICHA TÉCNICA
Textos: Samuel Beckett
Direção: Peter Brook
Colaboração: Lilo Baur e Marie Hélène Estienne
Elenco: Marcello Magni, Hayley Carmichael e Khalifa Natour
Iluminação: Philippe Vialatte
Espetáculo produzido pelo C.I.C .T. / Théatre des Bouffes du Nord, Paris, e por William Wilkinson para Millbrook Productions em co-produção com o Young Vic Theatre, Londres


De artes...

E essa semana aproveitei que estava na região da Paulista assinando um contrato e fiquei por lá mesmo. A Paulista é inegavelmente o coração de São Paulo mas não é sobre isso que quero falar.
Toy art é um conceito in. Não sei até que ponto é muito arte mas todo mundo que conheço que é descolado tem um ou dois brinquedos daquele artista ou grafiteiro. Os bonecos, em sua maioria, são bem divertidos. Tirei até umas fotos com meu celular mas elas ficaram péssimas.
E já que o Sesc Paulista fica em frente ao Itaú Cultural, que tem um restaurante caro mas bem charmoso, atravessei a rua para almoçar.
Acabou de abrir no Itaú Cultural Emoção Art.ficial 4.0 - Emergência!, quarta edição da Bienal Internacional de Arte e Tecnologia. A mostra reúne 16 obras que "tratam da imprevisibilidade dos resultados em diversos ambientes" e tem coordenação de Marcos Cuzziol e Guilherme Kujawski.
Engraçado como assim como a questão de Toy Art como arte essa história de arte e tecnologia pode atravessar limites. Sai de lá confusa. Reformulando, saí da exposição mais confusa. Achei tudo genial em termos teóricos, em termos de processo, interação e inventividade mas muito pouco tocada enquanto ser humano. Claro que passaria o dia todo na sala de Reler da Raquel Kogan mas isso deve-se em boa parte ao meu fetiche por livros. Seja como for, as duas exposições valem uma visita.
E deixo abaixo como dica a programação da VERBO que começa essa semana na Galeria Vermelho e tem parte acontecendo no Centro Cultural São Paulo.



Toy Arte Mania
Sesc Av Paulista - Av Paulista 119 - Mezanino
De 5 de julho a 10 de agosto - de terça a sexta, das 13h às 21h. Sábado, domingo e feriado, das 10h às 18h30.
Entrada franca

Emoção Art.ficial 4.0 - Emergência!
Itaú Cultural - Avenida Paulista, 149
de 2/7 a 14/9 - de terça a sexta, das 10h às 21h
Sábados, domingos e feriados, das 10h às 19h
Entrada franca

VERBO
Galeria Vermelho - Rua Minas Gerais nº 350

TERÇA-FEIRA
20h30:: COMIDA / cris bierrenbach
21h:: ANDRÉA / massimo grimaldi e sabina grasso
21h30:: De 7 a 10 MANEIRAS DE PERCEBER SEU CORPO / rose akras

QUARTA-FEIRA
20h30:: DO PÓ AO PÓ / laerte ramos
21h:: EXISTE ALGUMA POSSIBILIDADE ÉTICA QUE NÃO ACENE AO TOTALITARISMO? / daniel fagundes
21h30:: MULTIDÃO ZERO / grupo bijari

QUINTA-FEIRA
20h às 22h30:: DRA. DIVA / juliana notari
20h30:: CEGO DE NOVO / marcio banfi
21h30:: LEILÃO DOS PIORES TRABALHOS DE ARTISTAS / daniel murgel

SEXTA-FEIRA
20h:: DIÁLOGOS / jaime lauriano
20h:: TALCO-TEC-TIC-TALK-SHOW / fabiano marques
21h:: ELETRO-QUIMICOS, BABY / thelma bonavita e cristian duarte

SÁBADO
11h às 20h:: - ENCHENDO LINGUIÇA / luiz alfredo guedes
- 10 X 10 CADERNOS INSTANTÂNEOS / renato hofer
- MEIO-DIA / tiago primo
15h:: OLÉ / 3D
16h:: VERBO PEOPLE / FrenchMottershead
16h30:: MÁQUINA DE DESENHAR / michel groisman
17h:: VERMELHO NA VERMELHO / Sissí Fonseca e Hugo Fortes
18h:: ALTA TENSÃO / Yiftah Peled
18h30:: ENCHENDO LINGÜIÇA (churrasco) / luiz alfredo guedes

TODOS OS DIAS
20h às 22h30:: - ART BASEL GENEVA SÃO PAULO / Cris Faria e Lukas Mettler
- MOITARÁ / OPAVIVARÁ! e GrupoUM
- LA PERFORMOLA / carlos monroy

Seminário: Verbo Conjugado
de 15 a 18/7 - De terça a sexta, das 14h às 18h - Entrada franca - CCSP - Rua Vergueiro nº 100 - Piso Flávio de Carvalho - Sala Zero (80 lugares)

dia 15/7 - terça - das 14h às 18h
Performance e documentação
com: Amilcar Parker (artista plástico), Rubens Machado Jr. (professor da ECA/USP) e Yiftah Peled (artista plástico) - mediação: Fernanda Albuquerque (curadora associada de artes plásticas do CCSP)

dia 16/7 - quarta - das 14h às 18h
Performance e reencenação
com: Laura Lima (artista plástica), Lucio Agra (poeta, performer e professor da PUC/SP) e Fabio Cypriano (jornalista e professor da PUC/SP) - mediação: Lara Pinheiro (curadora de dança do CCSP)

dia 17/7 - quinta - das 14h às 18h
Performance e resistência cultural
com: Luiz de Abreu (coreógrafo e performer), Celso Favaretto (filósofo e professor da USP) e Eduardo Vederame (artista plástico) - mediação: Daniela Labra (curadora e crítica de arte)

dia 18/7 - sexta - das 14h às 18h
Performance e dança, teatro, artes plásticas e música
com: Lenora de Barros (artista plástica), Wilson Sukorski (músico e multinstrumentista), Rose Akras (coreógrafa e performer) e Alice K (performer e diretora teatral) - mediação: Marcos Gallon (organizador da mostra Verbo na Galeria Vermelho)
Apresentação da performance interativa Sirva-se, com participação de Michel Groisman (diretor), de Gabriela Duvivier e da platéia.

3 comentários:

Rosa Bertoldi disse...

Janaina:
Onde vc estava escondida esse tempo todo? Fale de teatro, fale de arte, fale de cultura contemporânea ou não, mas fale...escreva é a palavra. Vc sabe que eu faço parte daquele grupo Ju Machado, Lu Gonçalves, Jair Marangoni, Marcelo Garcia, sua mãe, eu, Rosa Gabrielli,etc, etc... que tomamos café de vez em quando para discutir de tudo um pouco?
Agora eu descobri porque os olhinhos da sua mãe brilham quando se refere a filha. Vc é tudo aquilo que ela fala é mais um pouco. Parabéns!!!!!!!!!!!

Camilla Tebet disse...

E eu gostaria de estar por ai pra ver tudo isso.
Beijos pra vc.

Andréa Zulian disse...

Oi, Jana!
vim conhecer o sete graus! adorei a id�ia!!!
j� vi que seu dia � o domingo!!!
beiju!