quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

fecha

abre os olhos.
deve ter sido o barulho da sirene.
diferente: um som suave, distante, improvável.
a noite imensa presa em seu quarto pesa sobre o rosto.
pensa em se virar. não consegue.
deve ser a preguiça da madrugada.
ou o vinho da noite.
vinho…
nota mental: evitar em noites tristes.
a cama parece mais áspera que antes.
ou seriam os pecados que castigam nas costas?
afinal, rasgam a pele feito chibatadas.
e não tem colchão de molas que dê jeito.
a consciência pesa.
em proporção matemática, o incômodo aumenta.
assim como o barulho da sirene.
olha, vai ser uma noite daquelas.
tenta lembrar o porquê, o onde, o quando.
mas está tudo embaralhado.
fios entrelaçados com boas lembranças, marcas de dores, sorrisos valentes.
deve ser restinho de sonho.
talvez um sonho bom…
vai saber?
pena que não lembra.
tomara que teve beijo na boca, sexo sujo, essas coisas…
até o pescoço dói. 
faz um esforço para virar pro lado e ver as horas.
não deve ser tão tarde assim…
nem lembra de ter ido para a cama.
maldito vinho…
a sirene já virou trilha sonora da noite.
e quando o pescoço termina o movimento, ele vê.
e não entende.
na calçada, pessoas paralisadas.
as mãos às bocas, os olhares, incrédulos.
não, não há lágrimas.
o silêncio ensurdece tanto que as bocas falam, mas ele não ouve.
filme dublado. idioma: terror.
só ouve a sirene.
sente algo escorrer pela barba.
mas a mão não obedece o braço, que não obedece o cérebro.
não consegue se mexer.
a dor aumenta.
mais pecados reclamando a consciência?
sonho bom que não é.
o que escorre pela barba invade a boca.
reconhece o gosto sofisticado do sangue.
dá até saudade do vinho.
a sirene berra.
e chega acompanhada de luzes, que invadem o escuro do quarto.
não entende. 
mas consegue imaginar.
sempre foi bom para pensar em histórias.
desde pequeno.
orgulho da professora de português.
pensa.
não está no quarto. não está deitado na cama. não tem preguiça.
pensa demais. 
queria não ter imaginado.
arrependimento é pecado?
se for, mais uma chicotada nas costas, por favor.
fecha os olhos para abri-los novamente.
quem sabe ainda é o sonho.
quem sabe?
fecha os olhos.
abre os olhos.

fecha os olhos.

4 comentários:

Janaina disse...

Thiago,
depois de ler essa aventura poética só digo "abre los ojos"

rosabertoldi@gmail.com disse...

Ou feche os olhos... diria Caetano veloso só pra contrariar! Parabéns Thiago Roque: um dia eu chego aí!

Camilla disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Camilla disse...

keeping my eyes wide open for your writing.