terça-feira, 29 de julho de 2008

Debaixo dos Caracóis...

Ganhei um disco da Fernanda Takai. Adorei! A moça tem voz suave e agradável cantando bossa nova numa homenagem à musa do movimento, Nara Leão. Lá pelas tantas ouço uma música que me fez entrar no túnel do tempo: os pesados anos de chumbo vividos pela sociedade brasileira durante o governo militar. Ele flutuava, ora acariciando, ora batendo com força nos estudantes e nos cidadãos por tentarem protestar contra a dita-dura. Passei pelo prédio do Dops como todo estudante daquela época. Confesso, eles nunca me bateram.
1970: só se falava em milagre brasileiro, termo relacionado ao desenvolvimento. Não me pergunte qual, por favor... A censura corria solta e o Brasil foi tricampeão. Os primeiros compact disc estavam sendo criado. Os Novos Baianos lançaram seu primeiro disco e a Tropicália estava em gestação. Gil e Caetano não tinham noção da importância futura do movimento na cultura brasileira. Raul Seixas, Jerry Adriane, Vanderléia, The Beatles, Jimi Hindrix, Janis Joplin eram nossos ídolos. Também tinha a dupla de compositores Erasmo e Roberto Carlos. O sonho acabou...desabafou John Lennon, enquanto o Brasil retrucou: o pesadelo mal começou.
Caetano Veloso exilado em Londres, teve permissão para passar um mês no Brasil, por ocasião dos quarenta anos de casados de seus pais. Quando ele desembarcou no Rio de
Janeiro foi recepcionado pelos militares e interrogado. O governo deu também seu recado: queria uma música dele elogiando a Transamazônica, uma obra que nunca foi concluída. Ele disse não e ironicamente seu próximo disco lançado na Inglaterra teve como título Transa. Nesse pano de fundo, Erasmo e Roberto Carlos compuseram uma música em homenagem ao baiano: Debaixo dos caracóis de seus cabelos. Daí o titulo do meu post e o motivo dessas recordações. Caetano Veloso não foi o único brasileiro a ficar no exílio. Talvez, ele tenha somente se tornado o mais conhecido. Fernando Henrique Cardoso e Ruth, Leonel Brizola, o governador Serra, Chico Buarque, David Capistrano Filho e muitos outros permaneceram longo tempo fora do país. Tinha também Erasmo e Roberto Carlos... frase escrita por puro preconceito. Como se eles fossem um mundo a parte. Daí a surpresa de muitos com a canção. O que deve ter marcado forte foi o fato de Roberto, considerado alienado pelos estudantes e pela classe intelectual compor a música. Qualquer um de nós gostaria de ter escrito os versos.

“As luzes e o colorido / que você vê agora / nas ruas por onde anda / na casa onde mora / você olha tudo e nada / lhe faz ficar contente / você só deseja agora / voltar pra sua gente”.

Sim, Caetano trouxe debaixo dos caracóis de seus cabelos muita história pra contar, mas deu a minha geração uma lição de tolerância e humildade difícil de esquecer, pois sempre gravou as músicas de Roberto e outros “cafonas” mostrando que cultura erudita e popular é só cultura. São as duas faces desse território verde/amarelo imenso.
Atualmente está preparando um show ao lado do rei Roberto Carlos e deve ter gente pensando que ele está pegando carona no sucesso do outro. O inverso é mais provável, mas deixa pra lá. Esse é o admirável Caetano Veloso, um poeta enormenormenorme...

3 comentários:

Mariah disse...

Fernanda Takai...ainda hoje ela me fazia compania num trânsito infernal em sampa...

"canta maria...a melodia singela...canta que a vida é um dia, que a vida é bela...minha maria"

eu adoro
mariah

Camilla Tebet disse...

Ê Rosa, escritora e tanto. Fluida, culta, sem ser arrogante... interessante. Fui fã do Caetano por muito tempo.. "terra, por mais distante que esse errante navegante...". Depois não quis mais ser fã.. essa coisa de VERDADE TROPICAL atrapalhou nosso relacionamento. Mas um dia desses, assisti a uma entrevista antiga dele. O repórter perguntou;
- Caetano, vc acha que o Brasil vai dar certo? ( e chamam isso de pergunta elaborada).
Ele responde
- Vai sim.
O repórter:
- POr que?
Caetano, no alto da sua sabedoria:
- Porque eu quero!
Puta resposta. Porque eu quero, ele quer, nos queremos.. todos nos temos memórias e lambranças, todos que reconhecem (e ´não só conhecem) a história do Brasil quer que ele dê certo. Aí está o Caetano que eu gosto.
Um beijo pra ti.

Camilla Tebet disse...

Querido, nem acho que seja um poeta menor nada não! E quem sou eu para tal. Só que deixei de gostar muito pra gostar um pouco. Sacou?? hehehe
beijso pra vc.