terça-feira, 8 de setembro de 2009

Eu reclamo o direito de ser infeliz

Aproveitando o espaço, estou publicando uma coluna do nosso colega Thiago Azevedo que saiu no Jornal da Cidade em 06/09/2009

"Dias atrás, tive, pela primeira vez em minha vida, a sincera sensação de envelhecer e sentir medo do futuro que desponta diante de nossos olhos. Essa espécie de velhice antecipada se mostrou para mim fazendo-me sentir pavor do destino da própria humanidade. A matéria de capa de uma revista de circulação nacional gelou-me a espinha e o conteúdo da reportagem me fez ter certeza de que, muitas vezes, a razão pode produzir monstros.
O texto previa um futuro em que a tecnologia estaria em todos os lugares de nossa vida, nas roupas, tênis, nas embalagens dos produtos dentro da geladeira. Estaria em nossos órgãos, em nosso fígado biônico comprado a prestações e capaz de não sintetizar determinada substâncias conforme orientado pelo médico; estaria em nosso olho scanner marca Carl Zeiss que, além de ver, tiraria fotos, filmaria e viria com Photoshop. Enfim, estaria em absolutamente tudo. Todos estes aparelhos seriam inteligentes e capazes de níveis simples de comunicação e raciocínio.
Como as máquinas teriam, além da inteligência, capacidade de comunicação numa rede de informações, todos os nossos dados, de pressão sanguínea, batimentos cardíacos e posicionamento em latitude/longitude no globo terrestre, tudo poderia ser monitorado por esta “matrix light”. Assim, reduziríamos o acaso e o imponderável a níveis nunca dantes imaginados e, portanto, não humanos (de acordo com minha idéia de humanidade). Estaríamos controlados, selecionados e catalogados. O autor do artigo, por mais bizarro que isso possa parecer, aprovava e incentiva a nova tecnologia, talvez por desconhecer suas conseqüências.
Lembrei-me do penúltimo capítulo de “Admirável Mundo Novo”, de Aldous Huxley, em que há o diálogo entre John, o selvagem, e o chefe, Mustafá Mond. Nesta passagem, o selvagem, após ouvir as inúmeras qualidades e vantagens do mundo perfeito, criado para os homens, e ver como o controle descaracterizou a humanidade afirma: “Eu reclamo o direito de ser infeliz!!!”.Pergunto: Haveria ou persistiria a condição humana se fossemos desprovidos do sofrimento? Se estivéssemos totalmente protegidos, controlados e tutelados por uma superestrutura que nos impedisse de desobedecer e, conseqüentemente, de sofrer e de existir. Haveria o homem, o Don Quixote, o Hamlet ou o Santo Cristo de Renato Russo? Os grandes pensadores como Brecht, Becket, Tennessee Williams ou Freud? Se me é facultado dividir uma impressão, é a de que duas coisas definem o humano: a dor e a incompletude. A dor é a conseqüência inevitável de nossa finitude, de nossa não-onisciência e da relação do homem com o imponderável. Somos humanos porque não somos super-homens. A tentativa do controle não nos retira a angústia, apenas cria mais opressão, pois os homens perderão sua sensação de liberdade, nada mais."

O autor, Thiago Azevedo Guilherme, é advogado e mestrando em direito pela ITE-Bauru, escreve às quartas feiras no blog www.setegrausdeseparacao.blogspot.com

Um comentário:

Anônimo disse...

Fiquei feliz lendo este artigo,simplesmente me provou que Thiago herdou a inteligencia de sua mãe ,seu avô materno,e seu tio ODILON AZEVEDO.PARABÉNS !Continue escrevendo o mundo carece de pessoas comc você.